Processo número: 0010.14.010631-0


CÂMARA CRIMINAL

Apelação Criminal n.º 001014010631-0
Apelante: Jaime Alves Figueira
Defesa: Dr. Roberto Guedes de Amorim OAB/RR/077A
Apelado: Ministério Público do Estado de Roraima
Relator: Des. Jésus Nascimento



VOTO

Presentes os pressupostos de admissibilidade, razão pela qual conheço o recurso.

A pretensão recursal reside tão somente no pedido de nulidade do julgamento formulado pela defesa técnica, em razão da negativa do pedido de adiamento da sessão do júri do dia 28/03/2017, na qual o ora apelante foi condenado pela 1ª Vara do Tribunal do Júri a uma pena de 16 anos e 04 meses de reclusão (cf. sentença às fls. 232/234), ocasião em que foi assistido por um defensor público.


No caso em análise, o advogado do apelante requereu no dia anterior o adiamento do Júri em virtude de sua viagem para a Comarca de Tuntum/MA, no período de 27 a 30 de março de 2017, para uma sessão de Júri referente a réu preso, juntando cópia das passagens (fl. 216/219) e posteriormente cópia da ata da referida sessão (cf. fls. 242/246).


Nas suas contrarrazões, o órgão ministerial assevera que o advogado do apelante atuou com desrespeito ao Judiciário e o Ministério Público, por ter informado apenas um dia antes (27/03/2017), que não poderia comparecer a sessão do Júri marcada para o dia 28/03/2017.


Consta na própria peça do recorrido que a sessão do Júri na Comarca de Tuntum/MA foi marcada dia 09/03/2017 para o dia 29/03/2017, tendo o advogado Roberto Guedes viajado na madrugada do dia 27/03/2017, deixando seu pedido de adiamento datado em 24/03/2017 (fl. 279) para ser protocolado no 1º Tribunal do Júri da comarca de Boa Vista/RR.


No caso o advogado Roberto Guedes deveria ter comunicado com maior antecedência a impossibilidade de seu comparecimento na sessão do Júri do dia 28/03/2017, porém, tal fato não mudaria a situação de que a defesa técnica constituída estaria ausente no julgamento.


O motivo do indeferimento do pedido foi de que já havia ocorrido um adiamento (fls. 194/195) e que o requerente não juntou comprovante do julgamento na Comarca de Tuntum/MA e nem da data de designação da sessão.


A magistrada da 1ª Vara do Tribunal do Júri da comarca de Boa Vista manteve a sessão e designou defensor publico para defender o réu Jaime Alves, justificando que a plenitude de defesa (art. 5°, XXXVIII, "a" da CF), princípio basilar do Tribunal do Júri, não significa o abuso de seu exercício, ressaltando que a sessão já havia sido adiada por motivo de moléstia do advogado de defesa, sendo remarcada com 04 meses de antecedência (cf. fls. 235/238).


Entretanto, após análise detida dos autos, observo que não houve abuso da plenitude de defesa, como apontado pelo Juízo a quo, vez que o primeiro adiamento se deu em virtude de pedidos de ambas as partes, conforme noticia a ata de fls. 194/195.


Doutra banda, o segundo pedido de adiamento da defesa foi devidamente justificado em virtude de viagem (fl. 217/219), para que o advogado Roberto Guedes participasse de uma sessão de júri de processo de réu preso da

Comarca de Tuntum/MA, conforme restou demonstrado pela juntada da cópia da ata (cf. fls. 242/246), sendo que inclusive o réu foi absolvido, com determinação de expedição de alvará se soltura.


Conforme demonstrado o réu se encontrava preso aqui em Boa Vista/RR na Penitenciária Agrícola de Monte Cristo - PAMC, tendo o júri sido realizado na  mencionada comarca do Estado do Maranhão.


Assim, resta claro que é caso de nulidade, pois o prejuízo suportado pelo apelante Jaime Alves é latente, uma vez que ele não queria ser representado por Defensor Público e este expressamente admitiu, às fls. 235, que não estava preparado adequadamente para realizar a defesa, em virtude do tempo exíguo (cerca de 12 horas), de acesso aos autos pedindo, inclusive, para constar em ata.


No caso, a observação do defensor público parece correta, uma vez que os autos foram encaminhados para a DPE no final da tarde e o júri estava marcado para a manhã seguinte. Destarte, a falta de tempo hábil para estudar o processo restou latente.


Releva frisar, que não obstante o primeiro adiamento ter sido motivado por ambas as partes, o órgão ministerial requereu que fosse nomeado um defensor   dativo para atuar na próxima sessão de julgamento, para evitar futuros adiamentos por parte da defesa, tendo o pedido ministerial sido deferido pelo Juízo, que nomeou defensor público (cf. ata de fls. 194/195). Todavia, a intimação da DPE só ocorreu após quatro meses, justamente na véspera da sessão do Júri.


Assim, a nulidade arguida pela defesa é manifesta, haja vista que foi violado o princípio da plenitude de defesa insculpido no art. 5°, XXXVIII, "a" da Constituição Federal.


Por todo o exposto e em dissonância com o parquet graduado, voto pelo provimento da apelação, com a declaração de nulidade do julgamento realizado na sessão do Júri de 28/03/2017.


Após o trânsito em julgado, baixem os autos para que seja realizado nova sessão do Júri.


É como voto.




EMENTA

APELAÇÃO CRIMINAL DA DEFESA – CONDENAÇÃO PELO CRIME DO ARTIGO 121, § 2º, II, DO CP – PEDIDO DE NULIDADE  – ALEGAÇÃO DE PREJUÍZO PELA AUSÊNCIA DE ADVOGADO CONSTITUÍDO NA SESSÃO DO JÚRI – PEDIDO DE ADIAMENTO DA SESSÃO INDEFERIDO PELO JUÍZO A QUO – DEFESA TÉCNICA QUE COMPROVOU SATISFATORIAMENTE SUA IMPOSSIBILIDADE DE COMPARECER À SESSÃO DO JÚRI EM VIRTUDE DE OUTRA DE RÉU PRESO MARCADA PARA A MESMA DATA EM COMARCA DIVERSA – RÉU MANIFESTOU DESEJO DE SER ASSISTIDO POR SEU ADVOGADO – DEFENSOR PÚBLICO TEVE POUCO TEMPO PARA ESTUDAR OS AUTOS – VIOLAÇÃO DO PRINCIPIO DA PLENITUDE DE DEFESA (ART. 5º, XXXVIII, ‘a’’ DA CF) – NULIDADE DECLARADA – RECURSO CONHECIDO E PROVIDO EM DISSONÂNCIA COM O PARQUET GRADUADO.
1. Pedido de adiamento de sessão do júri por parte da defesa indevidamente indeferido. Comprovação de atuação por parte do causídico em outra sessão do júri, esta relativa a réu preso, marcada em Comarca de outra unidade da Federação.
2. Pedido de nulidade em razão de inconformismo do réu em ser assistido pela Defensoria Pública. O acusado tem o direito de ser representado por advogado de sua confiança;
3. O Defensor Público pediu que ficasse registrado em ata que não possuía condições de assistir ao réu em razão de ter tido acesso aos autos somente na tarde anterior ao julgamento;
4. Efetivo prejuízo demonstrado pela violação ao princípio da amplitude de defesa. Nulidade reconhecida.



ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de Apelação Criminal, acordam os Excelentíssimos Senhores Desembargadores integrantes da Colenda Câmara Criminal do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, à unanimidade, e em dissonância com o parquet graduado, em conhecer a presente apelação e prover o recurso reconhecendo a nulidade arguida pela defesa, nos termos do voto do Relator, que fica fazendo parte deste Julgado. Participaram do julgamento o Des. Leonardo Cupello (Presidente da Câmara Criminal), Ricardo Oliveira (Julgador) e o (a) representante da douta Procuradoria de Justiça.
Sala das Sessões do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, aos onze dias do mês de setembro do ano de dois mil e dezoito.

Jésus Rodrigues do Nascimento
Des. Relator



RESUMO ESTRUTURADO
APELAÇÃO CRIMINAL DA DEFESA – CONDENAÇÃO PELO CRIME DO ARTIGO 121, § 2º, II, DO CP – PEDIDO DE NULIDADE  – ALEGAÇÃO DE PREJUÍZO PELA AUSÊNCIA DE ADVOGADO CONSTITUÍDO NA SESSÃO DO JÚRI – PEDIDO DE ADIAMENTO DA SESSÃO INDEFERIDO PELO JUÍZO A QUO – DEFESA TÉCNICA QUE COMPROVOU SATISFATORIAMENTE SUA IMPOSSIBILIDADE DE COMPARECER À SESSÃO DO JÚRI EM VIRTUDE DE OUTRA DE RÉU PRESO MARCADA PARA A MESMA DATA EM COMARCA DIVERSA – RÉU MANIFESTOU DESEJO DE SER ASSISTIDO POR SEU ADVOGADO – DEFENSOR PÚBLICO TEVE POUCO TEMPO PARA ESTUDAR OS AUTOS – VIOLAÇÃO DO PRINCIPIO DA PLENITUDE DE DEFESA (ART. 5º, XXXVIII, ‘a’’ DA CF) – NULIDADE DECLARADA – RECURSO CONHECIDO E PROVIDO EM DISSONÂNCIA COM O PARQUET GRADUADO.
1. Pedido de adiamento de sessão do júri por parte da defesa indevidamente indeferido. Comprovação de atuação por parte do causídico em outra sessão do júri, esta relativa a réu preso, marcada em Comarca de outra unidade da Federação.
2. Pedido de nulidade em razão de inconformismo do réu em ser assistido pela Defensoria Pública. O acusado tem o direito de ser representado por advogado de sua confiança;
3. O Defensor Público pediu que ficasse registrado em ata que não possuía condições de assistir ao réu em razão de ter tido acesso aos autos somente na tarde anterior ao julgamento;
4. Efetivo prejuízo demonstrado pela violação ao princípio da amplitude de defesa. Nulidade reconhecida.

TJRR (ACr 0010.14.010631-0, Câmara Criminal, Rel. Des. JÉSUS NASCIMENTO, julgado em 11/09/2018, DJe: 13/09/2018)