Processo número: 0010.10.007150-4


CÂMARA ÚNICA - TURMA CRIMINAL

Apelação Criminal nº 0010.10.007150-4
Apelante: Ramilton Lima Souza
Apelado: Ministério Público de Roraima
Relator: Juiz Convocado Mozarildo Cavalcanti



RELATÓRIO

Trata-se de Apelação Criminal interposta por Ramilton Lima Souza contra a sentença proferida pelo MM. Juiz da 4ª Vara Criminal da Comarca de Boa Vista, que o condenou a 2 (dois) anos de reclusão e 20 (vinte) dias-multa, sendo a pena privativa de liberdade substituída por duas restritivas de direitos, pela prática do crime previsto no art. 184 do Código Penal (violação de direitos autorais).

Em suas razões, a defesa pugna pela absolvição do apelante, sob o argumento de que não restou demonstrada a materialidade delitiva, uma vez que o laudo pericial não apontou todas as vítimas do direito autoral violado; e pela aplicação do princípio da insignificância (fls. 172/175). 

O Ministério Público, em contrarrazões, pugna pelo não provimento do recurso (fls. 179/185).

A Procuradoria de Justiça opina pelo conhecimento do recurso e, no mérito, pelo seu desprovimento (fls. 187/191).

Vieram-me os autos conclusos.

É o sucinto relato.

Encaminhe-se à revisão regimental.

Boa Vista - RR, 16 de março de 2015.


Juiz Convocado Mozarildo Cavalcanti
- Relator -



VOTO

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

Segundo a denúncia, no dia 28 de novembro de 2009, o réu vendia cópias não autorizadas de obras fonográficas e cinematográficas, sendo surpreendido com 191 unidades de CDs e 306 unidades de DVDs. O denunciado confessou, perante a autoridade policial, que o material apreendido lhe pertencia e que realizava a sua comercialização desde setembro daquele ano.

Após a instrução criminal, o réu foi condenado a 2 (dois) anos de reclusão e 20 (vinte) dias-multa, sendo a pena privativa de liberdade substituída por duas restritivas de direitos, pela prática do crime previsto no art. 184 do Código Penal (violação de direitos autorais).

O apelante, em suas razões recursais, requereu a absolvição, por não constar no laudo pericial todas as vítimas do direito autoral violado, ou a aplicação do princípio da insignificância. 

Entretanto, não há que se falar em absolvição, uma vez que, de acordo com o auto de apreensão e o laudo pericial acostados aos autos, foram apreendidos em poder do réu 191 mídias de CDs e 306 mídias de DVDs falsificados.

Além disso, o réu confirmou em juízo que comercializava CDs e DVDs falsificados.

Portanto, a materialidade e a autoria do crime encontram-se devidamente demonstradas nos autos.

No caso, a identificação específica das vítimas torna-se desnecessária, pois, tratando-se de forma qualificada de violação de direito autoral, a ação penal é pública incondicionada e o sujeito passivo do crime é a sociedade. 

Com efeito, a jurisprudência do STJ tem se posicionado no sentido de que, sendo o crime de violação de direito autoral descrito no art. 184, § 2º, do Código Penal, sujeito a ação penal pública incondicionada, e tendo sido constatada, por laudo pericial, a falsidade da mídia, é desnecessária, para a configuração de sua tipicidade, a identificação e inquirição do sujeito passivo.

Neste sentido:

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO DE DIREITOS AUTORAIS. TIPICIDADE DA CONDUTA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. NÃO APLICAÇÃO. ART. 184, § 2º, DO CÓDIGO PENAL - CP. ART. 530-D DO CÓDIGO PROCESSO PENAL - CPP. PERÍCIA SOBRE O CONTEÚDO DE TODOS OS BENS APREENDIDOS. EXIGÊNCIA QUE NÃO SE PRESTA PARA FINS DE COMPROVAÇÃO DA MATERIALIDADE DELITIVA. IDENTIFICAÇÃO DOS SUJEITOS PASSIVOS DO DELITO. DESNECESSIDADE. PRECEDENTES. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.
- A eg. Terceira Seção, no julgamento do REsp. n. 1.193.196/MG, sedimentou entendimento no sentido da inaplicabilidade do princípio da adequação social ao delito descrito no art. 184, § 2º, do Código Penal - CP, sendo considerada típica a conduta.
- Não obstante a redação do art. 530-D do Código de Processo Penal - CPP disponha que a perícia deva ser realizada sobre todos os bens apreendidos, essa exigência não se presta para fins de comprovação da materialidade delitiva, até porque basta a apreensão de um único objeto para que, realizada a perícia e concluído sobre a sua falsidade, esteja configurado o delito previsto no art. 184 do CP.
- A jurisprudência desta Corte Superior tem se posicionado no sentido de que, sendo o crime de violação de direito autoral descrito no art. 184, § 2º do Código Penal sujeito a ação penal pública incondicionada e tendo sido constatada, por laudo pericial, a falsidade da mídia, é desnecessária, para a configuração de sua tipicidade, a identificação e inquirição do sujeito passivo.
Agravo regimental desprovido.
(STJ - AgRg no REsp 1485007/MG, Rel. Ministro ERICSON MARANHO (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP), SEXTA TURMA, julgado em 02/12/2014, DJe 17/12/2014)

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. DIREITO PENAL. ART. 184, § 2º, DO CP. VIOLAÇÃO DE DIREITO AUTORAL. AUTO DE APREENSÃO. INOBSERVÂNCIA AO ART. 530-C DO CPP. MERA IRREGULARIDADE. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM PARA EXAME DAS DEMAIS QUESTÕES DISPOSTAS NA APELAÇÃO.
1. Na via especial, a discussão acerca da classificação jurídica dos fatos dispostos nos autos mitiga a incidência da Súmula 7/STJ.
2. A jurisprudência assente deste Superior Tribunal entende que a ausência de formalidades no autos de apreensão a que refere o art. 530-C do Código de Processo Penal caracteriza mera irregularidade, não ensejando nulidade ex officio da diligência, tampouco a absolvição da acusada por ausência de materialidade do crime.
3. A violação qualificada de direito autoral (art. 184, § 2º, do CP), sujeita à ação penal incondicionada, prescinde de perícia técnica sobre o conteúdo de cada bem fraudado para a caracterização da materialidade delitiva, que pode ser afirmada por exames visuais sobre a mídia fraudada. Despicienda, também, a identificação da vítima, que é a sociedade.
4. O agravo regimental não merece prosperar, porquanto as razões reunidas na insurgência são incapazes de infirmar o entendimento assentado na decisão agravada.
5. Agravo regimental improvido.
(STJ - AgRg no REsp 1475684/RS, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 14/10/2014, DJe 31/10/2014)

Quanto ao princípio da insignificância, é inviável o seu reconhecimento, pois violar direitos do autor não é figura penal irrelevante, uma vez que a norma penal visa proteger direito garantido, inclusive, constitucionalmente (CF, art. 5º, XXVII), e sua violação gera prejuízos ao fisco, aos autores, aos produtores, às gravadoras e à sociedade em geral. Ademais, o apelado detinha em seu poder o total de 497 (quatrocentas e noventa e sete) mídias falsificadas para serem revendidas, o que demonstra a existência de efetiva lesão ao bem jurídico tutelado pela norma penal.

Neste sentido:

APELAÇÃO CRIMINAL. VIOLAÇÃO DE DIREITO AUTORAL. EXPOSIÇÃO À VENDA DE CD'S E DVD'S CONTRAFEITOS. SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DA DEFESA. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO. NÃO ACOLHIMENTO. AUTORIA E MATERIALIDADE DO DELITO DEVIDAMENTE COMPROVADAS. PERÍCIA EM AMOSTRA. LAUDO DE EXAME DE OBRAS AUDIOVISUAIS ATESTANDO A FALSIDADE. PRINCÍPIOS DA ADEQUAÇÃO SOCIAL, DA INTERVENÇÃO MÍNIMIA E DA PROPORCIONALIDADE. INAPLICABILIDADE. ALEGAÇÃO DE ATIPICIDADE COM BASE NO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INVIABILIDADE. ESTADO DE NECESSIDADE. EXCLUDENTE DE ILICITUDE NÃO COMPROVADA NOS AUTOS. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.
1. O artigo 184, § 2º, do Código Penal, trata de uma das formas qualificadas do crime de violação de direito autoral, por meio do qual se pune o agente que, com o intuito de lucro direto ou indireto, pratica a conduta de distribuir, vender, expor à venda, alugar, introduzir no País, adquirir, ocultar ou ter em depósito, original ou cópia de obra intelectual ou fonograma reproduzido com violação do direito de autor, do direito do artista intérprete ou executante, ou do direito do produtor de fonograma.
2. No caso dos autos é de se manter o decreto condenatório, porquanto o acervo probatório, consistente nos depoimentos judiciais dos policiais responsáveis pela prisão em flagrante, aliado ao laudo de exame de obras audiovisuais, demonstra que o réu, detendo o pleno conhecimento da ilicitude de sua conduta, expôs à venda material com violação a direito autoral, com o intuito de lucro, amoldando-se sua conduta à figura típica do artigo 184, § 2º, do Código Penal.
3. Se pela amostra periciada restou suficientemente demonstrada a materialidade do delito de violação de direito autoral, tendo em vista a conclusão pela falsidade do material, dispensável o exame documentoscópico em todo o produto aprendido.
4. A conduta praticada pelo apelante não permite a aplicação do princípio da adequação social. Com efeito, não obstante ser público e notório que em grandes e pequenas cidades há o comércio de CDs e DVDs contrafeitos por pessoas de baixa renda com dificuldade a manutenção básica de seus familiares, certo é que, em razão do desvalor da ação e do desvalor do resultado, a conduta merece censura jurídica, devendo incidir os rigores da lei penal.
5. O conteúdo do injusto de violação de direito autoral não é irrisório, a ponto de incidir o princípio da insignificância, pois violar direitos do autor (crime que gera prejuízos ao fisco, aos autores, aos produtores, às gravadoras e à sociedade em geral) não é figura penal irrelevante. Ademais, não se mostra irrisória a mercadoria apreendida, composta por 610 (seiscentos e dez) DVDs e 50 (cinquenta) CDs.
6. Não há que se falar em absolvição pela aplicação da excludente de ilicitude do estado de necessidade se não há qualquer evidência de que o réu praticou o crime para salvar direito próprio ou alheio de perigo atual, cujo sacrifício não era razoável exigir.
7. Recurso conhecido e não provido para manter indene a sentença que condenou o réu pela prática do crime de violação de direito autoral, previsto no artigo 184, § 2º, do Código Penal, à pena de 02 (dois) anos de reclusão, em regime aberto, a qual foi substituída por duas restritivas de direito, e 10 (dez) dias-multa, no valor mínimo legal.
(STJ - Acórdão n.727719, 20110410241479APR, Relator: ROBERVAL CASEMIRO BELINATI, Revisor: SILVÂNIO BARBOSA DOS SANTOS, 2ª Turma Criminal, Data de Julgamento: 24/10/2013, Publicado no DJE: 28/10/2013. Pág.: 210)

DIREITOS AUTORAIS . PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA E DA ADEQUAÇÃO SOCIAL. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO.
1. Não se aplica o princípio da adequação social, bem como o princípio da insignificância, ao crime de violação de direito autoral .
2. Em que pese a aceitação popular à pirataria de CDs e DVDs, com certa tolerância das autoridades públicas em relação à tal prática, a conduta, que causa sérios prejuízos à indústria fonográfica brasileira, aos comerciantes legalmente instituídos e ao Fisco, não escapa à sanção penal, mostrando-se formal e materialmente típica.
3. Agravo regimental a que se nega provimento 
(STJ - AgRg no REsp 1380149/RS, Rel. Ministro Og Fernandes, Sexta Turma, julgado em 27/08/2013, DJe 13/09/2013).

PENAL. VIOLAÇÃO DE DIREITO AUTORAL . VENDA DE MÍDIAS FALSIFICADAS (CD's, DVD's e Jogos Eletrônicos). PRINCÍPIOS DA ADEQUAÇÃO SOCIAL E DA INSIGNIFICÂNCIA. AFASTAMENTO.
1. O entendimento desta Corte Superior firmou-se no sentido de considerar típica, formal e materialmente, a conduta prevista no artigo 184, § 2º, do Código Penal, afastando, assim, a aplicação do princípio da adequação social daquele que expõe à venda CD'S, DVD'S e Jogos Eletrônicos falsificados.
2. No caso, a quantidade de mercadorias apreendidas (137 mídias falsificadas) demonstra a existência de efetiva lesão ao bem jurídico tutelado pela norma penal, afastando a possibilidade de aplicação do princípio da insignificância.
3. Agravo regimental a que se nega provimento 
(STJ - AgRg no REsp 1344160/MS, Rel. Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, julgado em 05/02/2013, DJe 15/02/2013).

Dessa forma, correta a sentença que condenou o acusado pela prática do crime previsto no art. 184, § 2º, do Código Penal.

Por todo o exposto, em consonância com o parecer do Ministério Público, nego provimento ao recurso, mantendo intacta a sentença vergastada.

É como voto.

Boa Vista - RR, 24 de março de 2015.


Juiz Convocado Mozarildo Cavalcanti
- Relator -


EMENTA

APELAÇÃO CRIMINAL. VIOLAÇÃO AO DIREITO AUTORAL. LAUDO PERICIAL. COMPROVAÇÃO DA FALSIFICAÇÃO. MEDIDA SUFICIENTE. MATERIALIDADE COMPROVADA. DESNECESSIDADE DO LAUDO PERICIAL APONTAR TODAS AS VÍTIMAS DO DIREITO AUTORAL VIOLADO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. RECURSO DESPROVIDO.
A jurisprudência do STJ tem se posicionado no sentido de que, sendo o crime de violação de direito autoral descrito no art. 184, § 2º, do Código Penal, sujeito a ação penal pública incondicionada e tendo sido constatada, por laudo pericial, a falsidade da mídia, é desnecessária, para a configuração de sua tipicidade, a identificação e inquirição do sujeito passivo.
Inviável o reconhecimento do princípio da insignificância, pois violar direitos do autor não é figura penal irrelevante, uma vez que a norma penal visa proteger direito garantido, inclusive, constitucionalmente (art. 5º, XXVII, CF) e sua violação gera prejuízos ao fisco, aos autores, aos produtores, às gravadoras e à sociedade em geral. Ademais, o apelado detinha em seu poder o total de 497 (quatrocentas e noventa e sete) mídias falsificadas para serem revendidas, o que demonstra a existência de efetiva lesão ao bem jurídico tutelado pela norma penal. Recurso desprovido.



ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de Apelação Criminal nº 0010.007150-4, acordam os Excelentíssimos Senhores Desembargadores integrantes da Turma Criminal da Câmara Única do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, à unanimidade e em consonância com o parecer do Ministério Público, em NEGAR PROVIMENTO ao recurso, nos termos do voto do Relator, que fica fazendo parte integrante deste Julgado.

Participaram do julgamento o Des. Mauro Campello (Presidente), Juiz Convocado Leonardo Cupello (Julgador) e o representante da douta Procuradoria de Justiça.

Sala das Sessões do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, aos vinte e quatro dias do mês de março do ano de dois mil e quinze.


Juiz Convocado Mozarildo Cavalcanti
- Relator -



RESUMO ESTRUTURADO
APELAÇÃO CRIMINAL. VIOLAÇÃO AO DIREITO AUTORAL. LAUDO PERICIAL. COMPROVAÇÃO DA FALSIFICAÇÃO. MEDIDA SUFICIENTE. MATERIALIDADE COMPROVADA. DESNECESSIDADE DO LAUDO PERICIAL APONTAR TODAS AS VÍTIMAS DO DIREITO AUTORAL VIOLADO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. RECURSO DESPROVIDO.
A jurisprudência do STJ tem se posicionado no sentido de que, sendo o crime de violação de direito autoral descrito no art. 184, § 2º, do Código Penal, sujeito a ação penal pública incondicionada e tendo sido constatada, por laudo pericial, a falsidade da mídia, é desnecessária, para a configuração de sua tipicidade, a identificação e inquirição do sujeito passivo.
Inviável o reconhecimento do princípio da insignificância, pois violar direitos do autor não é figura penal irrelevante, uma vez que a norma penal visa proteger direito garantido, inclusive, constitucionalmente (art. 5º, XXVII, CF) e sua violação gera prejuízos ao fisco, aos autores, aos produtores, às gravadoras e à sociedade em geral. Ademais, o apelado detinha em seu poder o total de 497 (quatrocentas e noventa e sete) mídias falsificadas para serem revendidas, o que demonstra a existência de efetiva lesão ao bem jurídico tutelado pela norma penal. Recurso desprovido.

TJRR (ACr 0010.10.007150-4, Câmara Única, Rel. Juiz Conv. MOZARILDO CAVALCANTI, julgado em 24/03/2015, DJe: 07/04/2015)