Processo número: 0010.14.016291-7


CÂMARA ÚNICA - TURMA CRIMINAL

Apelação Criminal nº 0010.14.016291-7
Apelante: Ministério Público de Roraima
Apelado: Gessé Conceição Costa
Defensor Público: Wilson R. Leite da Silva
Relator: Des. Leonardo Pache de Faria Cupello



RELATÓRIO

Trata-se de Apelação interposta pelo Ministério Público, contra sentença proferida pelo Juiz Titular da 1ª Vara Criminal Residual, que absolveu sumariamente o apelado, em razão da aplicação do princípio da insignificância.

O apelante requer a modificação da sentença sob a alegação de que não estão presentes, de forma cumulativa, os requisitos que autorizam a aplicação do princípio da insignificância, tendo em vista que o acusado responde a outras ações penais.
Ao final, requer o provimento do apelo para que seja afastada a causa excludente de tipicidade, com o regular prosseguimento do feito.
Contrarrazões pelo não provimento do recurso (fls. 75/81).

A Procuradoria de Justiça manifestou-se pelo conhecimento e provimento do recurso (fls. 86/91).

Vieram-me os autos conclusos.

É o sucinto relato.

Encaminhe-se à revisão regimental.

Boa Vista - RR, 03 de novembro de 2015.

Des. Leonardo Pache de Faria Cupello



VOTO

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

Trata-se de insurgência do órgão ministerial contra decisão do primeiro grau que absolveu sumariamente o acusado pela aplicação do Princípio da Insignificância.

Penso razão não lhe assistir.
Ora, como sabido, a tipicidade penal congrega a adequação típica e a lesividade da conduta.
A adequação típica ou tipicidade formal verifica-se sempre quando a conduta - comissiva ou omissiva - do agente amoldar-se, com precisão, àquela abstratamente definida em lei como crime.
A lesividade ou tipicidade material, a seu turno, determina-se pela "repercussão" imposta, na sociedade, pela conduta perpetrada pelo agente. Noutras palavras, a conduta será materialmente típica quando, na prática, seriamente ofender bem jurídico tutelado. Somente assim importará ao Direito Penal, que deve ser mínimo, fragmentário.
Nesse contexto, conclui-se que o mínimo valor do resultado obtido autoriza o juiz a absolver o réu quando a conduta do agente não gerou prejuízo considerável para o lesado, nem foi cometida com o emprego de violência ou grave ameaça à pessoa. É, como esposado, o princípio do direito penal mínimo, adotado pela maioria dos Tribunais.
Conforme se depreende dos autos, o apelado foi denunciado pelo art. 155, c/c art. 14, II, ambos do CP, pela conduta de entrar em um Supermercado e tentar subtrair 04 facas, não conseguindo seu intento por circunstâncias alheias à sua vontade, tendo os bens retornado ao patrimônio da vítima.
Com efeito, estamos diante da prática de reconhecido furto simples, em sua forma tentada, de quatro facas que foram recuperadas pela vítima, que não experimentou prejuízo material.
Conforme entendimento majoritário, para que se reconheça o princípio da insignificância, faz-se necessário que a ofensa ao bem jurídico tutelado pela norma seja mínima, ou nenhuma. E, para tanto, devem concorrer os seguintes requisitos: a) mínima ofensividade da conduta do agente; b) nenhuma periculosidade social da ação; c) reduzido grau de reprovabilidade do comportamento; e d) inexpressividade da lesão jurídica provocada. É o caso dos autos.
Não verifico, na espécie, desvalor na conduta do agente ou em seu resultado, que evidencie maior periculosidade social decorrente da ação perpetrada.
Em que pesem as alegações do apelante de que o réu é contumaz em razão de possuir anotação de crime contra o patrimônio, deve-se ressaltar que não há registro de maus antecedentes, pois ação penal em curso não pode servir como maus antecedentes, nos termos da súmula 444 do STJ.
Ademais, deve-se ressaltar que, as circunstâncias de caráter pessoal, tais como reincidência e maus antecedentes, não devem impedir a aplicação do princípio da insignificância, pois este está diretamente ligado ao bem jurídico tutelado, que na espécie, devido ao seu pequeno valor econômico, está excluído do campo de incidência do direito penal.
Nesse sentido:
HABEAS CORPUS. WRIT SUBSTITUTIVO. TENTATIVA DE FURTO DE R$ 52,00 DE PESSOA JURÍDICA, EM 2011. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. ATIPICIDADE MATERIAL DA CONDUTA. APLICAÇÃO. MANIFESTO CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO.
1. Consoante já assentado pelo Supremo Tribunal Federal, o princípio da insignificância deve ser analisado em correlação com os postulados da fragmentariedade e da intervenção mínima do Direito Penal, no sentido de excluir ou afastar a própria tipicidade da conduta, examinada em seu caráter material, observando-se, ainda, a presença dos seguintes vetores: mínima ofensividade da conduta do agente; ausência total de periculosidade social da ação; ínfimo grau de reprovabilidade do comportamento e inexpressividade da lesão jurídica ocasionada.
2. O paciente, cuja absolvição sumária foi cassada em segunda instância, teria se aproveitado do momento em que um ônibus estava estacionado, sem ninguém em seu interior, para tentar subtrair a féria guardada no caixa (R$ 52,00), ação impedida por funcionário da empresa lesada.
3. A tentativa de subtração de valor inferior a 10% do salário-mínimo então vigente evidencia a escassa ofensividade penal e social da conduta, reconhecida pelo juiz de primeiro grau, sobretudo quanto a gravidade do comportamento foi inerente ao tipo penal.
4. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida de ofício para restabelecer a decisão de primeiro grau, que absolveu sumariamente o paciente. (HC 304.808/RJ, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 20/11/2014, DJe 11/12/2014).

****

APELAÇÃO CRIMINAL. RECURSO MINISTERIAL. ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA POR ATIPICIDADE DA CONDUTA. INCIDÊNCIA DO PRINCIPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. DECISÃO MANTIDA. 1. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA A imputação é pela prática de furto, na forma tentada, de um skate, um capacete e uma joelheira, avaliados indiretamente em cento e trinta e cinco reais (R$ 135,00), objetos integralmente recuperados em razão da prisão em flagrante do agente. Em se tratando de mercadorias produzidas em série e subtraídas de comerciantes, o valor deve corresponder ao custo de reposição de estoque e não, ao preço de varejo, pois este sempre traz embutido o ganho do comerciante. Sob essa ótica, a lesão patrimonial é ainda menor. Verificados os requisitos autorizadores da aplicação do princípio da insignificância, quais sejam, a mínima ofensividade da conduta do agente, a nenhuma periculosidade social da ação, o reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e a inexpressividade da lesão jurídica provocada, deve-se reconhecer a possibilidade de aplicação de tal princípio. 2. CONDIÇÕES PESSOAIS As condições pessoais do réu, verificadas através da reincidência ou de antecedentes não obstam a aplicação do princípio em tela, conforme precedentes do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça. RECURSO MINISTERIAL DESPROVIDO. (Apelação Crime Nº 70050263367, Sexta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: João Batista Marques Tovo, Julgado em 06/12/2012) (TJ-RS - ACR: 70050263367 RS , Relator: João Batista Marques Tovo, Data de Julgamento: 06/12/2012, Sexta Câmara Criminal, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 17/12/2012).

Diante de tais considerações, em dissonância com o parecer ministerial, conheço do recurso, mas nego provimento mantendo incólume a sentença vergastada.

É como voto.

Boa Vista - RR, 10 de novembro de 2015.

Des. Leonardo Pache de Faria Cupello
Des. Relator



EMENTA

PENAL. PROCESSO PENAL. TENTATIVA DE FURTO DE QUATRO FACAS, NA FORMA SIMPLES. RECURSO MINISTERIAL CONTRA SENTENÇA DE ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA POR ATIPICIDADE DA CONDUTA. INCIDÊNCIA DO PRINCIPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. DECISÃO MANTIDA. AUSÊNCIA DE TIPICIDADE MATERIAL. RECURSO DESPROVIDO EM DISSONÂNCIA COM O PARECER MINISTERIAL.
1. Conforme entendimento majoritário, para que se reconheça o princípio da insignificância, faz-se necessário que a ofensa ao bem jurídico tutelado pela norma seja mínima, ou nenhuma. E, para tanto, devem concorrer os seguintes requisitos: a) mínima ofensividade da conduta do agente; b) nenhuma periculosidade social da ação; c) reduzido grau de reprovabilidade do comportamento; e d) inexpressividade da lesão jurídica provocada. É o caso dos autos.
3. Recurso desprovido, em dissonância com o parecer do Ministério Público de segundo grau.
4. Sentença mantida.



ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de Apelação Criminal nº 0010.14.016291-7, acordam os Excelentíssimos Senhores Desembargadores integrantes da Turma Criminal da Câmara Única do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, à unanimidade e em consonância com o parecer do Ministério Público, em NEGAR PROVIMENTO ao recurso, nos termos do voto do Relator, que fica fazendo parte integrante deste Julgado.
Participaram do julgamento o Des. Ricardo Oliveira (Presidente), a Des. Elaine Bianchi (Julgadora) e o(a) representante da douta Procuradoria de Justiça.
Sala das Sessões do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, aos dez dias do mês de novembro do ano de 2015.

Leonardo Pache de Faria Cupello
Des. Relator



RESUMO ESTRUTURADO
PENAL. PROCESSO PENAL. TENTATIVA DE FURTO DE QUATRO FACAS, NA FORMA SIMPLES. RECURSO MINISTERIAL CONTRA SENTENÇA DE ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA POR ATIPICIDADE DA CONDUTA. INCIDÊNCIA DO PRINCIPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. DECISÃO MANTIDA. AUSÊNCIA DE TIPICIDADE MATERIAL. RECURSO DESPROVIDO EM DISSONÂNCIA COM O PARECER MINISTERIAL.
1. Conforme entendimento majoritário, para que se reconheça o princípio da insignificância, faz-se necessário que a ofensa ao bem jurídico tutelado pela norma seja mínima, ou nenhuma. E, para tanto, devem concorrer os seguintes requisitos: a) mínima ofensividade da conduta do agente; b) nenhuma periculosidade social da ação; c) reduzido grau de reprovabilidade do comportamento; e d) inexpressividade da lesão jurídica provocada. É o caso dos autos.
3. Recurso desprovido, em dissonância com o parecer do Ministério Público de segundo grau.
4. Sentença mantida.

TJRR (ACr 0010.14.016291-7, Câmara Única, Rel. Des. LEONARDO CUPELLO, julgado em 10/11/2015, DJe: 12/11/2015)