CÂMARA ÚNICA - TURMA CRIMINAL
APELAÇÃO CRIMINAL N.º 0010.06.141481-8 / BOA VISTA.
Apelante: Nivaldo Alfredo de Magalhães.
Defensor Público: José Roceliton Vito Joca.
Apelado: Ministério Público de Roraima.
Relator: Des. Ricardo Oliveira.
RELATÓRIO
Trata-se de recurso de apelação (fl. 286), interposto por NIVALDO ALFREDO DE MAGALHÃES, contra a r. sentença de fls. 279/283, da lavra da MM.ª Juíza de Direito Substituta da 1.ª Vara Criminal do Tribunal do Júri da Comarca de Boa Vista, que o condenou a cumprir pena de 06 (seis) anos de reclusão, no regime inicial semiaberto, pela prática do crime previsto no art. 121, caput, c/c art. 14, II, ambos do Código Penal.
O apelante, em suas razões (fls. 294/302), pugna pela anulação do julgamento, ao argumento de que a decisão do Conselho de Sentença foi contrária à prova dos autos ao não desclassificar a conduta para lesão corporal (art. 593, III, "d", do CPP), tendo em vista que o acusado desistiu voluntariamente de prosseguir na execução do homicídio. Subsidiariamente, requer a aplicação da atenuante da confissão, a fim de que a reprimenda seja reduzida (art. 593, III, "c", do CPP).
Em contrarrazões (fls. 305/313), o Ministério Público de 1.º grau requer seja desprovido o recurso.
Em parecer (fls. 320/328), opina o Ministério Público de 2.º grau pelo total desprovimento da apelação.
É o relatório.
À douta revisão regimental.
Boa Vista, 01 de dezembro de 2015.
Des. RICARDO OLIVEIRA
Relator
VOTO
O recurso deve ser desprovido.
Destaco, inicialmente, que não é objeto da apelação a desclassificação do crime de homicídio para lesão corporal, realizada pelo Conselho de Sentença, quanto à vítima Eugênio Pereira dos Santos (fl. 281).
A defesa, porém, recorre da decisão dos jurados que reconheceu o crime de homicídio simples, na modalidade tentada, em relação à vítima Bernaldo de Souza, por entender estar presente o animus necandi (fl. 279).
Não há nulidade do julgamento quando o Conselho de Sentença adota uma das teses apresentadas em plenário.
A decisão dos jurados não foi manifestamente contrária à prova dos autos, pois encontra respaldo probatório nos autos, especialmente o depoimento da vítima Bernaldo de Souza, prestado na 1.ª fase do Júri (fl. 85, CD-ROM), apresentado em plenário, esclarecendo que o acusado pretendia matá-lo por estar convivendo com sua ex-mulher.
Rejeitou-se, assim, a tese da desistência voluntária, que pressupõe não ter sido esgotado o iter criminis. Com efeito, a desistência voluntária é inaplicável ao caso, haja vista que o acusado, ao ser interpelado pela vítima, desferiu-lhe uma facada na região dorsal (fl. 87) e, em seguida, empreendeu fuga.
O Laudo de Exame de Corpo de Delito n.º 3412/09 - IML-RR (fl. 87) descreve a lesão sofrida pela vítima Bernaldo de Souza, sendo o animus necandi aferido conforme o acervo probatório e as informações objetivas extraídas da conduta, e não simplesmente da resposta negativa ao quesito n.º 04: "Houve Perigo de vida?".
Portanto, a decisão do Conselho de Sentença não se mostra contrária à prova dos autos, considerando que tal hipótese somente seria possível se a decisão dos jurados fosse totalmente divorciada do conjunto probatório, o que não é o caso em apreço. Nesse sentido:
"APELAÇÃO CRIMINAL - HOMICÍDIO DUPLAMENTE QUALIFICADO TENTADO - DECISÃO CONTRÁRIA À PROVA DOS AUTOS - IMPOSSIBILIDADE - ÍNTIMA CONVICÇÃO DOS JURADOS - DESISTÊNCIA VOLUNTÁRIA - INAPLICÁVEL AO CASO - DOSIMETRIA - READEQUAÇÃO DA PENA - INVIABILIDADE - RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO - 1- Se o Conselho de Sentença optou por uma das teses apresentadas em plenário e essa tese, por sua vez, é plausível porque amparada pelo conjunto probatório, não resta a menor dúvida de que se torna impossível a sua cassação, notadamente porque não pode o Tribunal dizer qual é a melhor solução para o caso. Precedentes do STJ e deste Tribunal. 2- Inviável à tese de desistência voluntária, eis que a prova dos autos aponta que o apelante realizou o que seria suficiente para atingir seu ímpeto homicida, ou seja, golpeou a vítima com 9 (nove) facadas, inocorrendo a morte por circunstâncias alheias à sua vontade. (...). 6- Recurso não provido" (TJES - Ap. n.º 0000091-71.2012.8.08.0002 - Rel. Subst. Jorge Henrique Valle dos Santos - DJe de 27.03.2015).
Quanto à atenuante da confissão, não é possível sua aplicação, haja vista que o acusado, apesar de ouvido apenas na fase policial (fl. 04, apenso), alegou que atingiu a vítima Bernaldo de Souza por ter sido agredido, ou seja, agregou tese defensiva. Sobre o tema:
"PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO CONSTITUCIONAL. COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL PARA JULGAR HABEAS CORPUS: CF, ART. 102, I, "D" E "I". ROL TAXATIVO. HOMICÍDIO DUPLAMENTE QUALIFICADO. ART. 121, § 2.°, I E IV, DO CÓDIGO PENAL. APLICAÇÃO DA PENA. ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA. NÃO INCIDÊNCIA. TESE DA EXCLUSÃO DE ILICITUDE. CONFISSÃO QUALIFICADA. DECISÃO PLENAMENTE FUNDAMENTADA. ORDEM DE HABEAS CORPUS EXTINTA POR INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. 1. A confissão qualificada não é suficiente para justificar a atenuante prevista no art. 65, III, "d", do Código Penal (Precedentes: HC n.º 74.148/GO, Rel. Min. Carlos Velloso, Segunda Turma, DJ de 17/12/1996 e HC n.º 103.172/MT, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, DJe de 24/09/2013). (...). 3. A aplicação da atenuante da confissão espontânea prevista no art. 65, III, "d", do Código Penal não incide quando o agente reconhece sua participação no fato, contudo, alega tese de exclusão da ilicitude. (...). 5. Ordem extinta por inadequação da via processual"
(STF, HC n.º 119671, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 05/11/2013, PROCESSO ELETRÔNICO, DJe-237, DIVULG 02-12-2013, PUBLIC 03-12-2013).
Assim, não caracteriza a atenuante genérica a chamada confissão qualificada, na qual o acusado reconhece sua participação no fato típico, mas aduz ter agido sob o manto de uma causa de exclusão da ilicitude. Nessa hipótese, a finalidade do réu é exercer sua autodefesa, e não contribuir para a descoberta da verdade real.
ISTO POSTO, em harmonia com o parecer ministerial, nego provimento à apelação.
É como voto.
Boa Vista, 10 de dezembro de 2015.
Des. RICARDO OLIVEIRA
Relator
EMENTA
APELAÇÃO CRIMINAL - TRIBUNAL DO JÚRI - HOMICÍDIO SIMPLES, NA MODALIDADE TENTADA (ART. 121, CAPUT, C/C ART. 14, II, AMBOS DO CP) - JULGAMENTO MANIFESTAMENTE CONTRÁRIO À PROVA DOS AUTOS - ALEGAÇÃO DE NULIDADE - INOCORRÊNCIA - DECISÃO DO CONSELHO DE SENTENÇA COM LASTRO PROBATÓRIO - DESISTÊNCIA VOLUNTÁRIA E DESCLASSIFICAÇÃO PARA CRIME DE LESÃO CORPORAL - NÃO CONFIGURAÇÃO - CONFISSÃO QUALIFICADA - ATENUANTE NÃO RECONHECIDA, CONFORME PRECEDENTES DO STF - RECURSO DESPROVIDO.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os membros da Câmara Única - Turma Criminal, do egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, por unanimidade, em harmonia com o parecer ministerial, em negar provimento à apelação, nos termos do voto do Relator.
Presenças: Des. Ricardo Oliveira (Presidente e Relator), Des. Mauro Campello (Revisor), Des. Leonardo Cupello (Julgador) e o representante da douta Procuradoria de Justiça.
Sala das Sessões, em Boa Vista, 10 de dezembro de 2015.
Des. RICARDO OLIVEIRA
Relator
RESUMO ESTRUTURADOAPELAÇÃO CRIMINAL - TRIBUNAL DO JÚRI - HOMICÍDIO SIMPLES, NA MODALIDADE TENTADA (ART. 121, CAPUT, C/C ART. 14, II, AMBOS DO CP) - JULGAMENTO MANIFESTAMENTE CONTRÁRIO À PROVA DOS AUTOS - ALEGAÇÃO DE NULIDADE - INOCORRÊNCIA - DECISÃO DO CONSELHO DE SENTENÇA COM LASTRO PROBATÓRIO - DESISTÊNCIA VOLUNTÁRIA E DESCLASSIFICAÇÃO PARA CRIME DE LESÃO CORPORAL - NÃO CONFIGURAÇÃO - CONFISSÃO QUALIFICADA - ATENUANTE NÃO RECONHECIDA, CONFORME PRECEDENTES DO STF - RECURSO DESPROVIDO.
TJRR (ACr 0010.06.141481-8, Câmara Única, Rel. Des. RICARDO OLIVEIRA, julgado em 10/12/2015, DJe: 04/02/2016)