CÂMARA CRIMINAL
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0045.14.000003-0
Apelante: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE RORAIMA
Apelados: JOSÉ WILSON FERREIRA DE MORAES e LIZIA FLAVIANA LOPES
Defensor Público: Dr. MARCOS ANTÔNIO JÓFFILY
Relator: Des. MAURO CAMPELLO
RELATÓRIO
Trata-se de Apelação Criminal interposta pelo Ministério Público do Estado de Roraima, em face de sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da Comarca de Pacaraima, que absolveu os apelados da prática do crime do art. 155, § 4º, IV (furto qualificado pelo concurso de pessoas), do Código Penal.
Em suas razões recursais (fls. 74/89), o Ministério Público requer, preliminarmente, que a decisão a quo seja declarada nula por ausência de fundamentação, ou alternativamente, para reformar a sentença e excluir a aplicação do princípio da insignificância, de modo a condenar os apelados pelo crime narrado na denúncia.
Em contrarrazões (fls. 93/105), a defesa pugna pelo desprovimento total do recurso.
Em seu parecer de fls. 110/113, o Parquet levanta a preliminar de desclassificação do delito para furto qualificado e privilegiado e, no tocante ao apelo, pugna pelo afastamento da preliminar de nulidade da sentença e, no mérito, pelo provimento do recurso.
Retornaram-me os autos.
É o relatório.
À douta revisão.
Boa Vista, 23 de junho de 2016.
VOTO
Deve o presente recurso ser conhecido, uma vez que atendidos os requisitos legais.
Analiso primeiramente a preliminar de nulidade da sentença por ausência de fundamentação.
Sabe-se que, nos termos da Constituição Federal, em seu art. 93, IX, bem como do legislação infraconstitucional, como o Novo CPC (art. 11, caput), as decisões judiciais devem ser devidamente motivadas, e, em não sendo, devem ser declaradas nulas.
Não é este o caso dos autos.
A sentença que repousa às fls. 63/64-verso, fundamenta devidamente sua conclusão pela absolvição "em razão da atipicidade da conduta, com base na aplicação do princípio da insignificãncia". Cita o depoimento da vítima em que esta diz que a res furtiva correspondia a produtos velhos, em mau funcionamento e com quase nenhum valor comercial. Chega a transcrever precedente do Supremo Tribunal Federal e outro do TRF da 1ª Região para amparar sua ratio decidendi.
Não há como se falar em ausência de motivação e, por conseguinte, em nulidade da sentença.
Sobre a preliminar requerida pela Procuradoria de Justiça às fls. 11-verso, de vez que se confunde com o mérito, pois obriga a analisar se o fato é típico ou não, para que então seja o crime desclassificado para furto qualificado privilegiado, de fato ela é, em tese, possível.
Após certa controvérsia na jurisprudência, foi editada a Súmula 511 do Superior Tribunal de Justiça: "É possível o reconhecimento do privilégio previsto no § 2º. do art. 155 do CP nos casos de furto qualificado, se estiverem presentes a primariedade do agente, o pequeno valor da coisa e a qualificadora for de ordem objetiva". A qualificadora do concurso de pessoas é de ordem objetiva (HC 324809 / SP, do STJ).
Contudo, se reconhecido o cabimento do princípio da insignificância, não há mais que se falar em tipicidade e, por conseguinte, não há como se dar a pretendida desclassificação.
Adianto, por isso, que no mérito deve ser mantida a decisão na parte em que, aplicando o princípio da bagatela ao caso, absolveu os apelantes.
No presente caso, estão presentes todos os requisitos para a aplicação do princípio da insignificância como causa supralegal de exclusão da tipicidade, a saber: a) conduta minimamente ofensiva; b) ausência de periculosidade do agente; c) reduzido grau de reprovabilidade do comportamento; e d) lesão jurídica inexpressiva.
Como dito ao norte, a própria vítima reconheceu que os bens furtados eram velhos e sem valor comercial expressivo, de modo que bem aplicado o princípio em comento.
Cumpre manter a decisão monocrática em seus termos.
Ante o exposto, em dissonância com o parecer ministerial, voto pelo afastamento das preliminares e pelo desprovimento do apelo.
Boa Vista, 05 de julho de 2016.
Des. MAURO CAMPELLO
Relator
E M E N T A
APELAÇÃO CRIMINAL. FURTO QUALIFICADO (EM CONCURSO DE AGENTES). RES FURTIVA DE VALOR COMERCIAL INEXPRESSIVO, CONFORME DEPOIMENTO DA PRÓPRIA VÍTIMA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA RECONHECIDA E APLICADA NA SENTENÇA. PRELIMINAR DE NULIDADE DE SENTENÇA POR FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO. INOCORRÊNCIA. RATIO DECIDENDI EXPRESSA. DESCLASSIFICAÇÃO PARA FURTO-QUALIFICADO-PRIVILEGIADO. POSSIBILIDADE EM TESE. SÚMULA 511 DO STJ. SENTENÇA ESCORREITA. PRINCÍPIO DA BAGATELA QUE NÃO DEVE SER AFASTADO. REQUISITOS PRESENTES. ABSOLVIÇÃO MANTIDA. PRELIMINARES AFASTADAS. APELAÇÃO DESPROVIDA.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os presentes autos da Apelação Criminal nº 0045.14.000003-0, em que são partes as acima indicadas, decide a Câmara Criminal do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, em dissonância com o Ministério Público Graduado, desprover o apelo, nos termos do Voto do Relator.
Estiveram presentes à Sessão os eminentes Desembargadores Ricardo Oliveira e Elaine Bianchi. Também presente o ilustre representante do Ministério Público.
Sala das Sessões do egrégio Tribunal de Justiça de Roraima, aos cinco dias do mês de junho do ano de dois mil e dezesseis.
Des. MAURO CAMPELLO
Relator
RESUMO ESTRUTURADOAPELAÇÃO CRIMINAL. FURTO QUALIFICADO (EM CONCURSO DE AGENTES). RES
FURTIVA DE VALOR COMERCIAL INEXPRESSIVO, CONFORME DEPOIMENTO DA PRÓPRIA
VÍTIMA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA RECONHECIDA E APLICADA NA SENTENÇA.
PRELIMINAR DE NULIDADE DE SENTENÇA POR FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO.
INOCORRÊNCIA. RATIO DECIDENDI EXPRESSA. DESCLASSIFICAÇÃO PARA
FURTO-QUALIFICADO-PRIVILEGIADO. POSSIBILIDADE EM TESE. SÚMULA 511 DO
STJ. SENTENÇA ESCORREITA. PRINCÍPIO DA BAGATELA QUE NÃO DEVE SER
AFASTADO. REQUISITOS PRESENTES. ABSOLVIÇÃO MANTIDA. PRELIMINARES
AFASTADAS. APELAÇÃO DESPROVIDA.
TJRR (ACr 0045.14.000003-0, Câmara Criminal, Rel. Des. MAURO CAMPELLO, julgado em 05/07/2016, DJe: 11/07/2016)