CÂMARA CRIMINAL
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0010.14.000198-2 - BOA VISTA/RR
APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DE RORAIMA
APELADOS: ELIERCIO DA SILVA PEIXOTO E OUTROS
DEFENSOR PÚBLICO: DR ROGENILTON FERREIRA GOMES
RELATOR: DES. LEONARDO CUPELLO
RELATÓRIO
Tratam os autos de Apelação Criminal interposta pelo Ministério Público de Roraima em face da sentença proferida pelo Juiz de Direito da 1ª Vara Criminal de Competência Residual da Comarca de Boa Vista, que absolveu os apelados pelo crime de furto, em razão da aplicação do princípio da insignificância.
Inconformado, o apelante aduz que, ao presente caso, não é cabível a aplicação do princípio da insignificância, tendo em vista que devem ser levados em consideração os aspectos objetivos e subjetivos do réu e da vítima.
Alega, ainda, que embora de pequeno valor a coisa furtada, o crime foi praticado em comércio modesto da periferia da cidade, devendo ser levado em consideração o fato de os réus terem praticado o crime de latrocínio, assassinando com uma enxada, uma terceira pessoa, com o fim de subtrair-lhe uma motocicleta (fls. 86/92).
Ao final, requer a reforma da sentença, para que os réus sejam condenados nos exatos termos da denúncia (fls. 86/92).
Contrarrazões às fls. 95/102, pelo desprovimento do recurso.
A douta Procuradoria de Justiça manifestou-se pelo conhecimento e desprovimento do presente apelo (fls. 105/110).
Os autos vieram-me conclusos.
É o relatório.
À douta Revisão regimental.
Boa Vista (RR), 03 de agosto de 2016.
Des. Leonardo Pache de Faria Cupello
Relator
VOTO
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do presente recurso.
Tratam os autos de Apelação Criminal interposta pelo Ministério Público de Roraima em face da sentença proferida pelo Juiz de Direito da 1ª Vara Criminal de Competência Residual da Comarca de Boa Vista, que absolveu os apelados pelo crime de furto, em razão da aplicação do princípio da insignificância.
Inconformado, o apelante aduz que, ao presente caso, não é cabível a aplicação do princípio da insignificância, tendo em vista que devem ser levados em consideração os aspectos objetivos e subjetivos do réu e da vítima.
Alega, ainda, que embora de pequeno valor a coisa furtada, o crime foi praticado em comércio modesto da periferia da cidade, devendo ser levado em consideração o fato de os réus terem praticado o crime de latrocínio, demonstrando, assim, personalidade voltada para a prática de crimes.
Pois bem, entendo que não assiste razão ao apelante.
Ora, como sabido, a tipicidade penal congrega a adequação típica e a lesividade da conduta.
A adequação típica ou tipicidade formal verifica-se sempre quando a conduta - comissiva ou omissiva - do agente amoldar-se, com precisão, àquela abstratamente definida em lei como crime.
A lesividade ou tipicidade material, a seu turno, determina-se pela "repercussão" imposta, na sociedade, pela conduta perpetrada pelo agente. Noutras palavras, a conduta será materialmente típica quando, na prática, seriamente ofender bem jurídico tutelado. Somente assim importará ao Direito Penal, que deve ser mínimo, fragmentário.
Nesse contexto, conclui-se que o mínimo valor do resultado obtido autoriza o juiz a absolver o réu quando a conduta do agente não gerou prejuízo considerável para o lesado, nem foi cometida com o emprego de violência ou grave ameaça à pessoa. É, como esposado, o princípio do direito penal mínimo, adotado pela maioria dos Tribunais.
Conforme se depreende dos autos, os apelados foram denunciados pelo art. 155, § 4º, IV do CP, pela conduta de entrar em um Bar e subtrair 01 garrafa de cachaça "51 ouro", no valor de R$ 10,00.
Segundo entendimento majoritário, para que se reconheça o princípio da insignificância, faz-se necessário que a ofensa ao bem jurídico tutelado pela norma seja mínima, ou nenhuma. E, para tanto, devem concorrer os seguintes requisitos: a) mínima ofensividade da conduta do agente; b) nenhuma periculosidade social da ação; c) reduzido grau de reprovabilidade do comportamento; e d) inexpressividade da lesão jurídica provocada. É o caso dos autos.
Não verifico, na espécie, desvalor na conduta dos agentes ou em seu resultado, que evidencie maior periculosidade social decorrente da ação perpetrada.
Em que pesem as alegações do apelante de que os réus têm a personalidade voltada para a prática de crimes, deve-se ressaltar que, as circunstâncias de caráter pessoal, tais como reincidência e maus antecedentes, não devem impedir a aplicação do princípio da insignificância, pois este está diretamente ligado ao bem jurídico tutelado, que na espécie, devido ao seu pequeno valor econômico, está excluído do campo de incidência do direito penal.
Nesse sentido:
HABEAS CORPUS. WRIT SUBSTITUTIVO. TENTATIVA DE FURTO DE R$ 52,00 DE PESSOA JURÍDICA, EM 2011. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. ATIPICIDADE MATERIAL DA CONDUTA. APLICAÇÃO. MANIFESTO CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO.
1. Consoante já assentado pelo Supremo Tribunal Federal, o princípio da insignificância deve ser analisado em correlação com os postulados da fragmentariedade e da intervenção mínima do Direito Penal, no sentido de excluir ou afastar a própria tipicidade da conduta, examinada em seu caráter material, observando-se, ainda, a presença dos seguintes vetores: mínima ofensividade da conduta do agente; ausência total de periculosidade social da ação; ínfimo grau de reprovabilidade do comportamento e inexpressividade da lesão jurídica ocasionada.
2. O paciente, cuja absolvição sumária foi cassada em segunda instância, teria se aproveitado do momento em que um ônibus estava estacionado, sem ninguém em seu interior, para tentar subtrair a féria guardada no caixa (R$ 52,00), ação impedida por funcionário da empresa lesada.
3. A tentativa de subtração de valor inferior a 10% do salário-mínimo então vigente evidencia a escassa ofensividade penal e social da conduta, reconhecida pelo juiz de primeiro grau, sobretudo quanto a gravidade do comportamento foi inerente ao tipo penal.
4. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida de ofício para restabelecer a decisão de primeiro grau, que absolveu sumariamente o paciente. (HC 304.808/RJ, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 20/11/2014, DJe 11/12/2014).
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APELAÇÃO CRIMINAL. RECURSO MINISTERIAL. ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA POR ATIPICIDADE DA CONDUTA. INCIDÊNCIA DO PRINCIPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. DECISÃO MANTIDA. 1. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA A imputação é pela prática de furto, na forma tentada, de um skate, um capacete e uma joelheira, avaliados indiretamente em cento e trinta e cinco reais (R$ 135,00), objetos integralmente recuperados em razão da prisão em flagrante do agente. Em se tratando de mercadorias produzidas em série e subtraídas de comerciantes, o valor deve corresponder ao custo de reposição de estoque e não, ao preço de varejo, pois este sempre traz embutido o ganho do comerciante. Sob essa ótica, a lesão patrimonial é ainda menor. Verificados os requisitos autorizadores da aplicação do princípio da insignificância, quais sejam, a mínima ofensividade da conduta do agente, a nenhuma periculosidade social da ação, o reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e a inexpressividade da lesão jurídica provocada, deve-se reconhecer a possibilidade de aplicação de tal princípio. 2. CONDIÇÕES PESSOAIS As condições pessoais do réu, verificadas através da reincidência ou de antecedentes não obstam a aplicação do princípio em tela, conforme precedentes do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça. RECURSO MINISTERIAL DESPROVIDO. (Apelação Crime Nº 70050263367, Sexta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: João Batista Marques Tovo, Julgado em 06/12/2012) (TJ-RS - ACR: 70050263367 RS , Relator: João Batista Marques Tovo, Data de Julgamento: 06/12/2012, Sexta Câmara Criminal, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 17/12/2012).
Diante de tais considerações, em consonância com o parecer ministerial, conheço do recurso, mas nego provimento mantendo incólume a sentença vergastada.
É como voto.
Boa Vista (RR), 13 de setembro de 2016
Des. Leonardo Pache de Faria Cupello
Relator
EMENTA
APELAÇÃO CRIMINAL. ART. 155 § 4º, IV, DO CPB. PLEITO QUE BUSCA A REFORMA DA SENTENÇA QUE ABSOLVEU OS RÉUS PELO RECONHECIMENTO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. IMPOSSIBILIDADE. FURTO DE UMA GARRAFA DE CACHAÇA NO VALOR DE R$ 10,00. INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. DECISÃO MANTIDA. AUSÊNCIA DE TIPICIDADE MATERIAL. RECURSO DESPROVIDO EM CONSONÂNCIA COM O PARECER DO MINISTÉRIO PÚBLICO GRADUADO.
1. Conforme entendimento majoritário, para que se reconheça o princípio da insignificância, faz-se necessário que a ofensa ao bem jurídico tutelado pela norma seja mínima, ou nenhuma. E, para tanto, devem concorrer os seguintes requisitos: a) mínima ofensividade da conduta do agente; b) nenhuma periculosidade social da ação; c) reduzido grau de reprovabilidade do comportamento; e d) inexpressividade da lesão jurídica provocada. É o caso dos autos.
3. Recurso desprovido, em consonância com o parecer do Ministério Público graduado.
4. Sentença mantida.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de Apelação Criminal nº 0010.14.000198-2 acordam os Excelentíssimos Senhores Desembargadores integrantes da Turma Criminal da colenda Câmara Única do egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, à unanimidade de votos, e em consonância com o parecer ministerial, em negar provimento ao recurso, nos termos do voto do relator, que fica fazendo parte integrante deste Julgado.
Participaram do julgamento o Desembargador Ricardo Oliveira (Presidente), o Juiz convocado, Dr. Paulo Cézar Dias Menezes e o (a) representante da douta Procuradoria de Justiça.
Sala de Sessões do egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, aos treze dias do mês de setembro de 2016.
Des. Leonardo Pache de Faria Cupello
Relator
RESUMO ESTRUTURADOAPELAÇÃO CRIMINAL. ART. 155 § 4º, IV, DO CPB. PLEITO QUE BUSCA A REFORMA
DA SENTENÇA QUE ABSOLVEU OS RÉUS PELO RECONHECIMENTO DO PRINCÍPIO DA
INSIGNIFICÂNCIA. IMPOSSIBILIDADE. FURTO DE UMA GARRAFA DE CACHAÇA NO
VALOR DE R$ 10,00. INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. DECISÃO
MANTIDA. AUSÊNCIA DE TIPICIDADE MATERIAL. RECURSO DESPROVIDO EM
CONSONÂNCIA COM O PARECER DO MINISTÉRIO PÚBLICO GRADUADO.
1.
Conforme entendimento majoritário, para que se reconheça o princípio da
insignificância, faz-se necessário que a ofensa ao bem jurídico tutelado
pela norma seja mínima, ou nenhuma. E, para tanto, devem concorrer os
seguintes requisitos: a) mínima ofensividade da conduta do agente; b)
nenhuma periculosidade social da ação; c) reduzido grau de
reprovabilidade do comportamento; e d) inexpressividade da lesão
jurídica provocada. É o caso dos autos.
3. Recurso desprovido, em consonância com o parecer do Ministério Público graduado.
4. Sentença mantida.
TJRR (ACr 0010.14.000198-2, Câmara Criminal, Rel. Des. LEONARDO CUPELLO, julgado em 13/09/2016, DJe: 20/09/2016)