CÂMARA CRIMINAL
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0020.11.001183-8 - CARACARAÍ/RR
APELANTES: ANDERSON DE OLIVEIRA SILVA E OUTRO
DEFENSOR PÚBLICO: JOSÉ JOÃO PEREIRA DOS SANTOS
APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DE RORAIMA
RELATOR: JUIZ CONVOCADO LUIZ FERNANDO MALLET
RELATÓRIO
Trata-se de Apelações Criminais interpostas por Jorge Sebastião da Silva e Anderson de Oliveira Silva, em face de sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da Comarca de Caracaraí, que condenou os apelantes Jorge a penas idênticas de 01 (um) ano de reclusão e 10 (dez) dias-multa, pela mesma prática delitiva de posse irregular de arma de fogo de uso permitido (art. 12 da Lei 10.826/03).
Nas suas razões recursais (fls. 271/278), os apelantes postulam a absolvição alegando falta de autoria e materialidade, ou, alternativamente, a detração de pena em relação ao apelante Jorge.
Contrarrazões do Ministério Público às fls. 279/284.
Às fls. 286/294, a insigne Procuradoria de Justiça opina pela desprovimento dos apelos, para manter-se incólume a sentença.
Retornaram-me os autos.
É o relatório.
À douta revisão.
Boa Vista, 05 de dezembro de 2017.
Juiz Convocado LUIZ FERNANDO MALLET
Relator
VOTO
Os recursos de apelação são tempestivos e preenchem os requisitos da lei, de modo que devem ser conhecidos.
Desde logo, faz-se necessária a transcrição de trechos da exordial acusatória, para melhor compreensão dos fatos:
PRIMEIRO ACUSADO
Conforme se extrai do incluso inquérito policial, no dia 08 de novembro do corrente ano, o primeiro acusado, JORGE SEBASTIÃO DA SILVA, foi custodiado em flagrante delito por possuir em seu residência (vide endereço declinado acima), 01 (uma) arma de fogo, calibre 20, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar, a qual foi adquirida em proveito próprio, mesmo sabendo ser produto de crime.
Com efeito, segundo restou apurado, apesar de sabedor da origem criminosa do bem, o primeiro acusado adquiriu a precipitada arma de fogo em compra do adolescente FERNANDO DE SOUZA, pessoa que havia subtraído a arma de terceiros dias antes, sendo que após a realização de diligências policiais, com a aquiescência do primeiro acusado, adentraram na residência deste e encontraram em uma das dependências o aludido armamento.
SEGUNDO ACUSADO
Por outro, na mesma ocasião em que foi descoberto o fato criminoso narrado anteriormente, constatou-se que o segundo acusado, ANDERSON DE OLIVEIRA SILVA, filho do primeiro acusado, mantinha sob sua guarda, no mesmo local acima mencionado, arma de fogo de uso permitido, tal seja, 01 (uma) escopeta, com calibre ainda não determinado, de fabricação caseira, sem autorização e em desacordo com determinação legal e regulamentar.
AUTORIA E MATERIALIDADE
A autoria e materialidade encontram-se clarividentes, fato este que se infere pelo auto de apresentação e apreensão de fl. 35, pelos autos de reconhecimento de pessoa às fls. 36/37, bem como dos depoimentos das testemunhas, bem como pela própria confissão dos acusados em sede policial.
Primeiramente, cumpre repelir o pedido de absolvição do apelante Anderson de Oliveira Silva por falta de provas.
Conforme se depreende dos autos, as armas de fogo apreendidas foram encontradas no interior da residência do apelante Anderson e de seu genitor (o apelante Jorge Sebastião), os quais assumiram a posse das armas apreendidas tanto em sede policial quanto em juízo. O interrogatório do apelante e o Auto de Exibição e Apreensão à fl. 35 são provas mais que suficientes de autoria e a materialidade delitivas.
Por oportuno, destaco que para a configuração do crime previsto no art. 12 do Estatuto do Desarmamento, é suficiente que o agente esteja na posse de arma de fogo ou de munição, em desacordo com os ditames legais. Trata-se, como nos delitos previstos nos arts. 14 e 16 da Lei 10.826/2003, de crime de perigo abstrato e de mera conduta.
RECURSO ESPECIAL. DIREITO PENAL. ESTATUTO DO DESARMAMENTO. POSSE IRREGULAR DE MUNIÇÃO DE USO PERMITIDO. CRIME DE PERIGO ABSTRATO. EXCEPCIONALIDADE DO CASO CONCRETO. ABSOLUTA AUSÊNCIA DE SIGNIFICADO LESIVO.
1. Os delitos previstos no Estatuto do Desarmamento são crimes formais, de mera conduta e de perigo abstrato e se consumam independentemente da ocorrência de efetivo prejuízo para a sociedade, sendo o dano presumido pelo tipo penal. Assim, como regra geral, é inaplicável o princípio da insignificância aos crimes de posse e porte de arma de fogo ou munição, notadamente porque não se cuidam de delitos desprovidos de periculosidade social em face mesmo da natureza dos bens jurídicos tutelados e do princípio da proteção eficiente.
2. Não obstante, inexiste perigo de lesão ou probabilidade de dano aos bens jurídicos tutelados pela norma na conduta de alguém que é ourives e vive de sua profissão comercializando jóias, sem qualquer notícia de envolvimento com práticas criminosas, em que foram apreendidas apenas três munições dentro da gaveta de uma mesa no interior do seu estabelecimento comercial, desacompanhadas de arma de fogo.
3. Recurso ministerial improvido.
(STJ - REsp 1699710/MS, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 07/11/2017, DJe 13/11/2017)
Conforme consta da ementa acima, não há que se cogitar do princípio da insignificância no caso dos crimes previstos no Estatuto do Desarmanento, ante a sua natureza de crimes de perigo abstrato, sendo desnecessário perquirir sobre a lesividade concreta da conduta do agente, porquanto o objeto jurídico tutelado naqueles não é a incolumidade física, e sim a segurança pública e a paz social.
Os apelantes foram condenados ambos a penas idênticas de 01 (um) ano de detenção (embora na sentença o juiz sentenciante faça referência a "reclusão"), além de 10 (dez) dias-multa, posteriormente substituídas, para ambos, por penas restritivas de direitos. Não vejo qualquer desacerto na dosagem da pena.
Embora reconhecido em favor dos dois apelantes a circunstância atenuante da confissão, o Magistrado não pôde aplicá-la, uma vez que a pena-base fora fixada já no mínimo legal. Aplicou-se, pois, a vedação contida na Súmula 231 do STJ: "A incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal".
Por fim, sobre o pedido de detração em relação ao apelante Jorge, vale destacar que deve ser apreciado pelo Juízo competente, isto, a Vara de Execução Penal, conforme reza o art. 387, § 2.º; LEP, art. 66, III, "c", do CPP.
APELAÇÕES CRIMINAIS - TRÁFICO DE DROGAS (ART. 33, CAPUT, DA LEI N.º 11.343/06) - PRELIMINAR DE NULIDADE ABSOLUTA DA SENTENÇA POR FALTA DE INDIVIDUALIZAÇÃO DAS PENAS - REJEIÇÃO - MÉRITO - ABSOLVIÇÃO - IMPOSSIBILIDADE - MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS - NECESSIDADE, PORÉM, DE REDUÇÃO DAS REPRIMENDAS, COM ALTERAÇÃO DO REGIME PRISIONAL PARA O SEMIABERTO - RECONHECIMENTO DO TRÁFICO PRIVILEGIADO (ART. 33, § 4.º, DA LEI DE DROGAS) - INVIABILIDADE - DEDICAÇÃO À ATIVIDADE CRIMINOSA CARACTERIZADA - DETRAÇÃO - COMPETÊNCIA DO JUÍZO DA EXECUÇÃO - DIREITO DE RECORRER EM LIBERDADE - EXTENSÃO AO PRIMEIRO APELANTE - RECURSOS PARCIALMENTE PROVIDOS.
(TJRR - ACr 0010.15.003651-4, Rel. Des. RICARDO OLIVEIRA, Câmara Criminal, julg.: 25/07/2017, DJe 27/07/2017, p. 15-16)
Ante o exposto, em consonância com o parecer ministerial, voto pelo desprovimento dos apelos.
Boa Vista, 19 de dezembro de 2017.
Juiz Convocado LUIZ FERNANDO MALLET
Relator
EMENTA
APELAÇÕES CRIMINAIS. ESTATUTO DO DESARMAMENTO. CRIME DE POSSE IRREGULAR DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO. ABSOLVIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. PROVAS TESTEMUNHAIS E CONFISSÃO DOS APELANTES. ART. 12 DA LEI 10.826/2003. CRIME DE PERIGO ABSTRATO E DE MERA CONDUTA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. DOSAGEM DA PENA. INDEFECTIBILIDADE. ATENUANTE DA CONFISSÃO. INCIDÊNCIA QUE NÃO PODE REBAIXAR A PENA PARA AQUÉM DO MÍNIMO LEGAL. SÚMULA 231 DO STJ. DETRAÇÃO DA PENA. COMPETÊNCIA DO JUÍZO DA EXECUÇÃO. APELOS DESPROVIDOS, EM CONSONÂNCIA COM O PARECER MINISTERIAL.
1. Não há que se falar que a condenação se impôs mercê da falta de provas, se o Juiz levou em conta a confissão do crime (posse de arma de fogo de uso permitido) pelos próprios acusados, convergindo com o depoimento dos policiais que apreenderam as armas na residência deles e os conduziu para a delegacia.
2. Tendo sido encontradas na posse dos apelantes armas de fogo em desacordo com os mandamentos legais, configurado está o crime do art. 12 do Estatuto do Desarmamento, que é delito formal, de perigo abstrato e de mera conduta.
3. Dado que os bens jurídicos tutelados nos delitos do Estatuto do Desarmamento são a segurança pública e a paz social, inaplicável se torna nesse caso o princípio da insignificância.
4. Ainda que haja a confissão dos acusados, não será incidível a atenuante da confissão, quando a pena-base for já fixada no mínimo legal, sob pena de ofensa à Súmula 231 do STJ.
5. É do Juízo da Execução penal a competência para apreciar pedidos de detração da pena, ex vi do art. 387, § 2.º; LEP, art. 66, III, "c", do CPP.
Apelos desprovidos, em consonância com o parecer ministerial.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os presentes autos da Apelação Criminal nº 0020.11.001183-8, em que são partes as acima indicadas, decide a Turma Criminal da Câmara Única do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, em conhecer e negar provimento ao apelo, nos termos do Voto do Relator.
Estiveram presentes à Sessão os eminentes Desembargadores Ricardo Oliveira e Leonardo Cupello. Também presente o ilustre representante do Ministério Público.
Sala das Sessões do egrégio Tribunal de Justiça de Roraima, aos dezenove dias do mês de dezembro do ano de dois mil e dezessete.
Juiz Convocado LUIZ FERNANDO MALLET
Relator
RESUMO ESTRUTURADOAPELAÇÕES CRIMINAIS. ESTATUTO DO DESARMAMENTO. CRIME DE POSSE IRREGULAR DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO. ABSOLVIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. PROVAS TESTEMUNHAIS E CONFISSÃO DOS APELANTES. ART. 12 DA LEI 10.826/2003. CRIME DE PERIGO ABSTRATO E DE MERA CONDUTA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. DOSAGEM DA PENA. INDEFECTIBILIDADE. ATENUANTE DA CONFISSÃO. INCIDÊNCIA QUE NÃO PODE REBAIXAR A PENA PARA AQUÉM DO MÍNIMO LEGAL. SÚMULA 231 DO STJ. DETRAÇÃO DA PENA. COMPETÊNCIA DO JUÍZO DA EXECUÇÃO. APELOS DESPROVIDOS, EM CONSONÂNCIA COM O PARECER MINISTERIAL.
1. Não há que se falar que a condenação se impôs mercê da falta de provas, se o Juiz levou em conta a confissão do crime (posse de arma de fogo de uso permitido) pelos próprios acusados, convergindo com o depoimento dos policiais que apreenderam as armas na residência deles e os conduziu para a delegacia.
2. Tendo sido encontradas na posse dos apelantes armas de fogo em desacordo com os mandamentos legais, configurado está o crime do art. 12 do Estatuto do Desarmamento, que é delito formal, de perigo abstrato e de mera conduta.
3. Dado que os bens jurídicos tutelados nos delitos do Estatuto do Desarmamento são a segurança pública e a paz social, inaplicável se torna nesse caso o princípio da insignificância.
4. Ainda que haja a confissão dos acusados, não será incidível a atenuante da confissão, quando a pena-base for já fixada no mínimo legal, sob pena de ofensa à Súmula 231 do STJ.
5. É do Juízo da Execução penal a competência para apreciar pedidos de detração da pena, ex vi do art. 387, § 2.º; LEP, art. 66, III, "c", do CPP.
Apelos desprovidos, em consonância com o parecer ministerial
TJRR (ACr 0020.11.001183-8, Câmara Criminal, Rel. Juiz Conv. LUIZ FERNANDO MALLET, julgado em 19/12/2017, DJe: 10/01/2018)