Processo número: 9000590-75.2018.8.23.0000


CÂMARA CÍVEL -SEGUNDA TURMA

Agravo de Instrumento nº 9000590-75.2018.8.23.0000
Agravante: Dizanete Matias Advocacia e Consultoria Jurídica
Agravado: Darlene dos Santos Gomes
Relator: Des. Mozarildo Monteiro Cavalcanti



RELATÓRIO

Trata-se de agravo de instrumento interposto em face da decisão proferida no processo n° 0834836-15.2014.8.23.0010, a qual determinou o pagamento das custas para o início da fase de cumprimento de sentença.
A agravante alega, em síntese, que não se trata de nova ação ou novo processo, mas mera fase processual, não havendo motivos para a cobrança de taxa para esse fim.

Ao final, pede o conhecimento e o provimento do recurso para que seja reformada a decisão, a fim de que seja iniciada a fase de cumprimento de sentença sem a exigência do recolhimento das custas.

Em contrarrazões, a parte agravada pede o desprovimento do recurso (EP 8).

Inclua-se o recurso na pauta de julgamento eletrônico, na forma prevista no RITJRR.

Des. Mozarildo Monteiro Cavalcanti
Relator



VOTO

Presentes os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso.

A questão em análise restringe-se ao cabimento de recolhimento de custas para o início da fase de cumprimento de sentença.

Inicialmente, cumpre destacar que as custas processuais têm natureza jurídica de tributo, na modalidade de taxa. Confira-se:

I. Ação direta de inconstitucionalidade: L. 959, do Estado do Amapá, publicada no DOE de 30.12. 2006, que dispõe sobre custas judiciais e emolumentos de serviços notariais e de registros públicos, cujo art. 47 - impugnado - determina que a "lei entrará em vigor no dia 1º de janeiro de 2006": procedência, em parte, para dar interpretação conforme à Constituição ao dispositivos questionado e declarar que, apesar de estar em vigor a partir de 1º de janeiro de 2006, a eficácia dessa norma, em relação aos dispositivos que aumentam ou instituem novas custas e emolumentos, se iniciará somente após 90 dias da sua publicação. II. Custas e emolumentos: serventias judiciais e extrajudiciais: natureza jurídica. É da jurisprudência do Tribunal que as custas e os emolumentos judiciais ou extrajudiciais tem caráter tributário de taxa. (grifo nosso) III. Lei tributária: prazo nonagesimal. Uma vez que o caso trata de taxas, devem observar-se as limitações constitucionais ao poder de tributar, dentre essas, a prevista no art. 150, III, c, com a redação dada pela EC 42/03 - prazo nonagesimal para que a lei tributária se torne eficaz. (STF. ADI 3694, Relator(a): Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Tribunal Pleno, julgado em 20/09/2006, DJ 06-11-2006 PP-00030 EMENT VOL-02254-01 PP-00182 RTJ VOL-00201-03 PP-00942 RDDT n. 136, 2007, p. 221) 

 
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. CABIMENTO. PROVIMENTO Nº 09/97 DA CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA DO ESTADO DE MATO GROSSO. EMOLUMENTOS: PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS NOTARIAIS E DE REGISTRO. 1. Provimento nº 9/97, da Corregedoria Geral da Justiça do Estado de Mato Grosso. Caráter normativo. Controle concentrado de constitucionalidade. Cabimento. 2. Hipótese em que o controle normativo abstrato não se situa no âmbito da legalidade do ato, mas no exame da competência constitucional da autoridade que instituiu a exação. 3. A instituição dos emolumentos cartorários pelo Tribunal de Justiça afronta o princípio da reserva legal. Somente a lei pode criar, majorar ou reduzir os valores das taxas judiciárias. Precedentes. (grifo nosso)
4. Inércia da União Federal em editar normas gerais sobre emolumentos. Vedação aos Estados para legislarem sobre a matéria com fundamento em sua competência suplementar. Inexistência. Ação direta de inconstitucionalidade julgada procedente. (STF. ADI 1709, Relator(a): Min. MAURÍCIO CORRÊA, Tribunal Pleno, julgado em 10/02/2000, DJ 31-03-2000 PP-00038 EMENT VOL-01985-01 PP-00001) 

 
Conforme o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, são devidas as custas judiciais nessa fase processual. Vejamos:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. DESERÇÃO DO RECURSO. 1. Nos termos do que decidido pelo Plenário do STJ, "[a]os recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas até então pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça" (Enunciado Administrativo n. 2). 2. Esta Corte possui entendimento no sentido de que são devidas custas judiciais na fase de cumprimento de sentença, de forma que, não sendo comprovada a regularidade do preparo no momento da interposição do recurso, é de se reconhecer a deserção. Precedentes: EDcl no AgRg no AREsp 713.072/RS, Rel. Min. Marco Buzzi, Quarta Turma, DJe 6/10/2016; AgRg no REsp 1.389.036/RS, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, DJe 10/09/2015; AgInt no AREsp 852.914/RJ, Rel. Min. Raul Araújo, Quarta Turma, DJe 24/10/2016. (grifo nosso) 3. Agravo regimental não provido. (AgRg no REsp 1535017/CE, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 07/02/2017, DJe 14/02/2017)


AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. AUSÊNCIA DE RECOLHIMENTO DE CUSTAS NO PRAZO LEGAL. DESERÇÃO. CANCELAMENTO DA DISTRIBUIÇÃO. 1. São devidas custas judiciais na fase de cumprimento de sentença, devendo o valor correspondente ser recolhido no prazo de 30 dias previsto no art. 257 do CPC, independentemente de intimação da parte, contados, sob pena de cancelamento da distribuição. 2. Agravo regimental não provido. (AgRg nos EDcl no REsp 1274329/PR, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 19/11/2015, DJe 30/11/2015)


Não obstante o entendimento do STJ, no direito tributário incide o princípio da estrita legalidade, sendo necessária legislação específica para a cobrança da taxa. Não basta a existência de lei em sentido formal para a incidência do tributo, é necessário também que haja obediência à legalidade tributária material.

Assim, para a cobrança das custas processuais na fase de cumprimento de sentença é necessário que exista lei, em sentido formal e material, determinando de forma objetiva os critérios para o pagamento do tributo.

No caso dos autos, a decisão que determinou o pagamento das custas processuais na fase de cumprimento de sentença teve por fundamento o disposto no artigo 10, inciso III, da Lei Estadual nº 1.157/16, que revogou a Lei nº 752/2009 e instituiu a cobrança de custas, estabelecendo o seguinte:

Art. 10. Salvo as exceções estabelecidas nesta Lei, as custas judiciais incidirão sobre o valor da causa em três fases distintas do processo:
I – no momento da distribuição;
[II – como preparo da apelação, do agravo, do recurso adesivo e dos embargos infringentes, e nos processos da competência originária do Tribunal; III– ao ser proposta a execução.
§ 1º Nas fases previstas no inciso I e III do caput deste artigo o percentual sobre o valor da causa não poderá exceder a 2% (dois por cento), em cada uma dessas fases e, na prevista no inciso II, o percentual sobre o valor da causa não poderá exceder a 4% (quatro por cento).


Constata-se, então, a existência de lei que estabelece o pagamento de custas na fase de execução. Contudo, sua eficácia está parcialmente suspensa, o que impede a cobrança da referida taxa neste momento.

A decisão proferida nos autos da ADI nº 0600035-02.2017.8.23.0010, que trata sobre inconstitucionalidade na Lei nº 1.157/2016, suspendeu liminarmente a eficácia do dispositivo legal citado, e a norma anterior (Lei nº 752/09) não é específica quanto ao recolhimento de custas na fase de cumprimento de sentença. Confira-se:

(...) Por tais razões, com fulcro no §1º, do art. 145, do RITJRR, defiro, parcialmente, o pedido de medida liminar, ad referendum do Tribunal Pleno, para suspender, até o julgamento definitivo desta ação direta de inconstitucionalidade, a eficácia dos seguintes dispositivos da Lei nº 1.157/2016: a) alíneas d.1, d.2 e d.3, do ítem E, da tabela B, do anexo 1; b) art. 10, I, II, III e §§ 1º, 2º, 3º (primeira parte), 4º, 5º e 6º, do art. 11, III, bem como do anexo 1, tabelas A e B. Como consequência, ficam revigorados, no que for compatível com a presente decisão, os valores fixados na legislação anterior de custas. (DJE 5977) Lei nº 752/09 Art. 8º Salvo as disposições concernentes à justiça gratuita, cabe às partes prover as despesas dos atos que realizam ou requerem no processo, antecipando-lhes o pagamento desde o início até sentença final; e, bem ainda, a execução, até a plena satisfação do direito declarado pela sentença. (grifo nosso)

Dessa forma, tendo em vista o princípio da estrita legalidade tributária, não é possível a cobrança de custas processuais para o pedido de cumprimento de sentença, sem que exista legislação em vigor específica para a incidência da referida taxa.

Em amparo, cito os seguintes precedentes desta Corte:

AGRAVO DE INSTRUMENTO - IMPUGNAÇÃO AO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA - EXIGÊNCIA DE RECOLHIMENTO DE CUSTAS - NATUREZA TRIBUTÁRIA - DISPOSITIVOS DA LEI N.º 1.157/2016 SUSPENSOS ATÉ O JULGAMENTO DO MÉRITO DA ADI N.º 0600035- 02.2017.8.23.0000 - AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL PARA COBRANÇA - INAPLICABILIDADE DO ART. 89 DO COJERR - IMPOSSIBILIDADE DE COBRANÇA - INOCORRÊNCIA DE PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. Tendo em vista que a ADI n.º 0600035-02.2017.8.23.0000 determinou, até o julgamento final da ação, a suspensão dos dispositivos da Lei n.º 1.157/2016 que preveem o recolhimento de custas na fase de cumprimento de sentença, a exigência do pagamento não encontra previsão legal. Não há como se falar em prescrição intercorrente na hipótese, se a demora processual se deu principalmente por culpa do executado/agravante. (TJRR – AgInst 0000.17.002425-1, Rel. Des. TANIA VASCONCELOS, 1ª Turma Cível, julg.: 09/02/2018, public.: 21/02/2018, p. 18)


AGRAVO DE INSTRUMENTO. FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. COBRANÇA DE CUSTAS. SUSPENSÃO CAUTELAR DO ART. 10, III, DA LEI ESTADUAL N.º 1.157/2016, NOS AUTOS DA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE N.º 0600035-02.2017.8.23.0000. AUSÊNCIA DE SUPORTE LEGAL PARA A COBRANÇA DAS RESPECTIVAS CUSTAS. PRECEDENTES DESTA EGRÉGIA CORTE DE JUSTIÇA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (TJRR – AgInst 0000.17.001605-9, Rel. Des. JEFFERSON FERNANDES DA SILVA, 2ª Turma Cível, julg.: 16/11/2017, public.: 21/11/2017, p. 22)


Face ao exposto, dou provimento ao recurso para determinar que seja dado regular prosseguimento ao feito, sem o recolhimento das custas judiciais.

Boa Vista, 24 de setembro de 2018.


Des. Mozarildo Monteiro Cavalcanti
Relator



EMENTA

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. COBRANÇA DE CUSTAS. SUSPENSÃO CAUTELAR DO DISPOSITIVO LEGAL QUE REGULA A MATÉRIA. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL PARA A COBRANÇA DA TAXA. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA ESTRITA LEGALIDADE TRIBUTÁRIA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.
1. Para a cobrança das custas processuais na fase de cumprimento de sentença é necessário que exista lei, em sentido formal e material, determinando de forma objetiva os critérios para o pagamento do tributo.
2. Tendo em vista o princípio da estrita legalidade tributária, não é possível a cobrança de custas processuais para o pedido de cumprimento de sentença, sem que exista legislação em vigor específica para a incidência da referida taxa.



ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os membros da Segunda Turma da Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, à unanimidade, em dar provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator.

Participaram do julgamento os Desembargadores Almiro Padilha, Mozarildo Monteiro Cavalcanti e o Juiz convocado Rodrigo Furlan.

Sessão Virtual do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, aos 28 dias do mês de setembro de 2018.


Des. Mozarildo Monteiro Cavalcanti
Relator



RESUMO ESTRUTURADO
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. COBRANÇA DE CUSTAS. SUSPENSÃO CAUTELAR DO DISPOSITIVO LEGAL QUE REGULA A MATÉRIA. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL PARA A COBRANÇA DA TAXA. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA ESTRITA LEGALIDADE TRIBUTÁRIA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.
1. Para a cobrança das custas processuais na fase de cumprimento de sentença é necessário que exista lei, em sentido formal e material, determinando de forma objetiva os critérios para o pagamento do tributo.
2. Tendo em vista o princípio da estrita legalidade tributária, não é possível a cobrança de custas processuais para o pedido de cumprimento de sentença, sem que exista legislação em vigor específica para a incidência da referida taxa. 

TJRR (AgInst 9000590-75.2018.8.23.0000, Segunda Turma Cível, Rel. Des. MOZARILDO CAVALCANTI, julgado em 28/09/2018, DJe: 01/10/2018)