Processo número: 0823509-17.2019.8.23.0010


CÂMARA CRIMINAL

APELAÇÃO CRIMINAL N.º 0823509-17.2019.8.23.0010 / BOA VISTA.
1.º Apelante: Adriel Aleixo da Silva.
Advogado: Adonilton da Conceição.
2.º Apelante: Romário dos Santos e Santos.
Advogado: Marcos Vinicius Martins de Oliveira.
Apelado: Ministério Público de Roraima.
Relator: Des. Ricardo Oliveira.



RELATÓRIO

Tratam os autos de apelações (EP 110.1 e 112.1 – mov. 1.º grau), interpostas por ADRIEL ALEIXO DA SILVA e ROMÁRIO DOS SANTOS E SANTOS, contra a r. sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da Vara de Entorpecentes e Organizações Criminosas (EP 91.1 – mov. 1.º grau), que os condenou por infração aos arts. 33, caput, e 35, ambos da Lei n.º 11.343/06, em concurso material (CP, art. 69).

O apelante ADRIEL foi condenado a 8 (oito) anos de reclusão, em regime inicial semiaberto, e ao pagamento de 1.200 (mil e duzentos) dias-multa, no valor unitário mínimo.

Em razões recursais (EP 15.1), pugna pela absolvição de ambos os delitos, por insuficiência de provas. 

Subsidiariamente, requer: (i) a desclassificação do crime de tráfico de drogas para o de porte para uso próprio (art. 28 da Lei n.º 11.343/06); (ii) a redução da pena-base para o mínimo legal; (iii) a aplicação da causa de diminuição do art. 33, § 4.º, da Lei n.º 11.343/06 (tráfico privilegiado); (iv) a conversão da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos; e (v) o estabelecimento do regime inicial aberto para cumprimento da pena.

O apelante ROMÁRIO foi condenado a 8 (oito) anos de reclusão, em regime inicial semiaberto, e ao pagamento de 1.200 (mil e duzentos) dias-multa, no valor unitário mínimo.

Em suas razões (EP 33.1), suscita preliminar de nulidade da sentença por ausência de fundamentação idônea (sentença genérica). No mérito, requer a absolvição de ambos os crimes, alegando que não há provas suficientes para a condenação.

Subsidiariamente, requer: (i) a desclassificação do crime de tráfico de drogas para o de porte para uso próprio (art. 28 da Lei n.º 11.343/06); (ii) a redução da pena-base para o mínimo legal; (iii) a aplicação da causa de diminuição do art. 33, § 4.º, da Lei n.º 11.343/06 (tráfico privilegiado); e (iv) concessão do direito de recorrer em liberdade.

Em contrarrazões (EP 37.1), o apelado requer a rejeição da preliminar de nulidade e, no mérito, pretende a manutenção do decisum guerreado.

Em parecer (EP 42.1), opina o Ministério Público de 2.º grau pela rejeição da preliminar suscitada e, no mérito, pelo desprovimento dos recursos.

É o relatório.

À douta revisão regimental.

Boa Vista, 18 de março de 2021.


Des. RICARDO OLIVEIRA
Relator 



VOTO

Passo a examinar, inicialmente, a preliminar suscitada pelo apelante Romário dos Santos e Santos, visto que seu resultado poderá influenciar ambos os recursos.

Alega o recorrente que a sentença deve ser anulada por apresentar fundamentação inidônea na condenação imposta, asseverando que o decisum é genérico e não individualiza devidamente as condutas e as penas aplicadas.

Não lhe assiste razão.

Com efeito, a sentença apresenta todos os requisitos contidos no art. 381 do CPP: (i) a identificação das partes; (ii) a exposição sucinta da acusação e da defesa, tendo como relatório a ata da audiência; (iii) a análise da tese defensiva aventada em memoriais finais, especialmente sobre a participação dos acusados, a não aplicação do tráfico privilegiado, bem como os critérios para fixação da pena, conforme art. 42 da Lei n.º 11.343/06 e art. 59 do CP; (iv) a indicação dos motivos de fato e de direito em que se funda a decisão; (v) a indicação dos artigos de lei aplicados; (vi) o dispositivo; (vii) a data e a assinatura digital do Juiz (EP 91.1 – mov. 1.º grau).

De acordo com Norberto Avena, “a exigência de fundamentação não significa, necessariamente, motivação extensa, sendo lícito ao juiz justificar suas decisões objetivamente, bastando que externe as razões de seu convencimento, de forma a permitir que a defesa possa apresentar argumentos contrários em eventual impugnação que venha a propor” (in Processo Penal, 2017, p. 1.116).
 
Ante o exposto, rejeito a preliminar.

Quanto ao mérito, narra a denúncia que, no dia 30 de julho de 2019, por volta das 19h53, na Rua Almir Fofocas, n.º 1837, bairro Senador Hélio Campos, nesta cidade, os ora apelantes Adriel Aleixo da Silva e Romário dos Santos e Santos, em associação delitiva, foram presos em flagrante por terem em depósito e venderem drogas, das quais foram apreendidos 202,40g (duzentos e dois gramas e quarenta decigramas) de cocaína em pedra – crack, substância de uso proscrito no Brasil, atestada pelos laudos periciais juntados no EP 1.1, p. 22, e EP 69.1 (mov. 1.º grau).

Segundo apurado, agentes policiais, em patrulhamento de rotina, receberam informações do Serviço de Inteligência da Polícia Militar de que, no endereço indicado, haveria intensa comercialização de substâncias entorpecentes, constando, ainda, denúncias de populares de que o acusado Adriel dominaria o tráfico ilícito de entorpecentes no bairro.

Diante das informações, os policiais se dirigiram ao endereço e localizaram Romário próximo a uma pizzaria. Em revista no acusado, foi encontrada, em sua cintura, a substância ilícita, a qual estava embalada em 8 (oito) invólucros prontos para comercialização. Ato contínuo, se dirigiram à residência de Adriel, com quem foi encontrada a quantia de R$ 180,00 (cento e oitenta reais).

Perante a autoridade policial, Romário afirmou que é usuário de drogas e contratado por Adriel apenas para entregar entorpecentes, recebendo, em troca, certa quantidade de pasta-base para seu consumo. Por sua vez, Adriel admitiu a propriedade do entorpecente e afirmou que lucrava de R$ 100,00 (cem reais) a R$ 150,00 (cento e cinquenta reais) pela comercialização.
 
Irresignados com a condenação, os réus apelam da sentença, pretendendo, primeiramente, a absolvição de ambos os crimes.

O pedido não comporta provimento.

A autoria e a materialidade delitivas restaram comprovadas através do boletim de ocorrência (EP. 1.1, p. 3); auto de apreensão e apresentação (EP. 1.1, p. 17 – mov. 1.º grau); laudos de exame preliminar e definitivo (EP 1.1, p. 22 – mov. 1.º grau, e EP 69.1, pp. 3/6 – mov. 1.º grau), e também pelos depoimentos das testemunhas e confissões dos próprios apelantes.

O apelante Romário confirmou, em juízo, que estava com a droga apreendida e que receberia de Adriel uma certa quantidade de pasta- base de cocaína para seu consumo pessoal, em troca do serviço de entrega da substância ilícita. Declarou que, no dia da prisão, iria realizar uma entrega de droga por ordem de Adriel, admitindo, ainda, que há aproximadamente três meses vinha realizando tais serviços para Adriel, negando, porém, que guardasse droga em sua residência. Relatou que Adriel lhe ligava, na parte da noite, pedindo para efetuar entregas e, então, ia até a casa dele para pegar a droga.

Por sua vez, o apelante Adriel confessou, em juízo, que havia se associado a Romário há três meses, cabendo a este a entrega das drogas, enquanto ele próprio se encarregava das vendas. Confirmou que comercializava somente pasta-base, admitindo que, em seu celular, constavam as mensagens com pedido da droga. Declarou que lucrava em torno de R$ 100,00 (cem reais) a R$ 150,00 (cento e cinquenta reais) com a comercialização, que serviam para manter o seu próprio vício de cocaína em pó e também para pagar suas contas. Relatou que se associou com Romário há três meses, a quem conhecia desde a infância por morarem próximos, e que não comercializava entorpecente com outra pessoa, a não ser Romário.

As confissões de ambos apelantes são corroboradas pela prova testemunhal.

A testemunha Sérgio Silva Régis, policial militar que atuou na prisão em flagrante dos acusados, declarou, em juízo, que a droga apreendida (pasta-base de cocaína) estava com Romário, o qual dissera, por ocasião da sua prisão, que caberia a ele próprio entregar o entorpecente a uma terceira pessoa, por ordem de Adriel. Afirmou que, com Adriel, foi encontrada a quantia em dinheiro de R$ 180,00 (cento e oitenta reais). Esclareceu que Romário admitiu ser usuário e que receberia parte da droga para seu consumo pessoal, como pagamento pelo serviço de entrega. Confirmou seu relato prestado na fase extrajudicial, no qual Adriel admitira que a droga encontrada com Romário lhe pertencia.
 
A testemunha Arisson Sousa Magalhães, policial militar, declarou, em juízo, que a equipe policial, após receber um informe do Serviço de Inteligência da Polícia Militar sobre a prática de tráfico por parte dos réus, abordou primeiramente Romário, sendo com ele apreendido um invólucro grande, contendo outros menores, com pasta-base de cocaína. Esclareceu que Romário confirmou ser o “guarda-roupa” de Adriel, a quem pertencia o entorpecente. Afirmou que Romário admitiu ser usuário e que receberia de Adriel uma certa porção do entorpecente para seu consumo pessoal, em troca do serviço de entrega da droga.

Deveras, “o depoimento dos policiais prestado em juízo constitui meio de prova idôneo a resultar na condenação do [réu], notadamente quando ausente qualquer dúvida sobre a imparcialidade das testemunhas, cabendo à defesa o ônus de demonstrar a imprestabilidade da prova, fato que não ocorreu no presente caso” (STJ, HC 165.561/AM, Rel. Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, DJe 15/02/2016).

Nesse contexto, restou comprovado não só o crime de tráfico, mas também o de associação para o tráfico, ambos admitidos pelos apelantes em seus depoimentos judiciais, confirmando os elementos colhidos nos autos que evidenciam a associação dos recorrentes para o tráfico ilícito de drogas, caracterizada pelo ânimo de permanência e estabilidade, vez que demonstradas funções determinadas para cada integrante, sendo que Adriel fornecia drogas para Romário entregá-las a terceiros.

Cabe ressaltar que restou caracterizado que a prática ocorreu de forma habitual e costumeira, conforme relato dos próprios apelantes, tendo em vista que a associação perdurou por três meses, sempre se repetindo o modus operandi em que Adriel ligava para Romário, geralmente à noite, a fim de que este efetuasse as entregas da pasta-base a terceiros.

Portanto, a segura prova testemunhal, aliada ao exame detido dos demais elementos colhidos durante a instrução criminal, com especial destaque para as confissões dos acusados, é suficiente para se demonstrar a existência dos delitos de tráfico de drogas e de associação para o tráfico, bem como das suas autorias, em conformidade com o sistema do livre convencimento motivado.

Nessa linha:

“APELAÇÃO CRIMINAL - TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES - MATERIALIDADE E AUTORIA DEVIDAMENTE COMPROVADAS - CIRCUNSTÂNCIAS DA APREENSÃO DA DROGA - DEPOIMENTOS DOS POLICIAIS EM CONSONÂNCIA COM O CONJUNTO PROBATÓRIO - PROVAS SUFICIENTES DO COMÉRCIO ILÍCITO - CONDENAÇÃO MANTIDA - ISENÇÃO DO PAGAMENTO DAS CUSTAS PROCESSUAIS - PEDIDO PREJUDICADO - CONCESSÃO EM PRIMEIRA INSTÂNCIA - RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. I - Tendo a prova dos autos, em seu conjunto, apontado para a prática do comércio ilegal de entorpecentes em desfavor do réu, é de se manter a sentença condenatória recorrida, não havendo se falar em absolvição. II - Os depoimentos testemunhais dos policiais envolvidos na prisão do acusado, desde que harmônicos com o contexto probatório e não maculados por interesses particulares, são idôneos para fundamentar a sua condenação. III - Prejudicado se encontra o pleito de isenção do pagamento das custas processuais já concedido em primeira instância” (TJMG - Apelação Criminal 1.0024.17.012677-5/001, Relator(a): Des.(a) Adilson Lamounier, 5.ª Câmara Criminal, j. 24/07/2018, publicação da súmula em 30/07/2018).

Logo, demonstrada autoria e materialidade dos delitos previstos nos arts. 33, caput, e 35, ambos da Lei de Drogas, a manutenção da condenação é medida que se impõe.
 
Em relação ao pedido de desclassificação para o crime de porte de drogas para consumo pessoal, o art. 28, § 2.º, da Lei n.º 11.343/06 é muito claro ao dispor que, “para determinar se a droga se destinava-se a consumo pessoal, o juiz atenderá à natureza e à quantidade da substância apreendida, ao local e às condições em que se desenvolveu a ação, às circunstâncias sociais e pessoais, bem como à conduta e aos antecedentes do agente”.

No caso, verifica-se que a tese desclassificatória não se sustenta, seja pelas circunstâncias da prisão, que contou com a apreensão de invólucros prontos para comercialização, seja pela prova testemunhal corroborada pelas confissões judiciais de ambos os acusados.

Tais confissões se amoldam perfeitamente aos depoimentos prestados pelas testemunhas policiais, que confirmaram terem os réus admitido esses detalhes por ocasião de suas prisões.

Vale lembrar, também, que a quantidade da droga apreendida em poder dos réus – 202,40g de cocaína em pedra (crack) – substância de elevado grau de nocividade, não se coaduna com a tese de que os acusados seriam, tão somente, usuários de drogas.

Dessa forma, impossível a desclassificação pretendida, sobretudo em razão das circunstâncias em que foi apreendida a droga, que demonstram que ela não se destinava exclusivamente ao consumo pessoal. Convém lembrar que o delito do art. 33, caput, da Lei n.º 11.343/06 é crime de ação múltipla, admitindo várias condutas, dentre elas “trazer consigo”, “ter em depósito” e “vender”.

Nesse sentido:

“APELAÇÃO CRIMINAL - TRÁFICO ILÍCITO DE DROGAS - CONJUNTO PROBATÓRIO EFICAZ - DESCLASSIFICAÇÃO DO CRIME DE TRÁFICO PARA USO PRÓPRIO (ART. 28, CAPUT, DA LEI 11.343/06) - IMPOSSIBILIDADE - FALTA DE PROVA IDÔNEA A DEMONSTRAR ESSA ÚNICA FINALIDADE - A SIMPLES ALEGAÇÃO DE TRATAR-SE DE USUÁRIO DE DROGAS, DESACOMPANHADA DE ELEMENTOS DE PROVA, NÃO TEM O CONDÃO DE ELIDIR A TRAFICÂNCIA - SENTENÇA MANTIDA - RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.
1) A quantidade de entorpecente apreendido, bem como o local e condições em que se desenvolveu a ação criminosa, além das circunstâncias do caso indicam que a droga não se destinava exclusivamente a consumo pessoal. 2) ‘A simples alegação, sem qualquer prova, de ser o réu dependente ou usuário, ou mesmo de que possuía a droga para seu exclusivo consumo pessoal não constitui, por si só, motivo para a pretendida desclassificação, porque nada impede que o usuário, ou dependente, seja também traficante.’ (TJPR - 5.ª C. Criminal - AC 793210-9 - Jacarezinho - Rel.: Rogério Coelho - Unânime - J.9.2.2012). 3) O delito de tráfico de drogas dispensa a presença de qualquer elemento subjetivo específico, bastando que o agente tenha a consciência e a vontade de praticar um dos 18 (dezoito) verbos constantes do art. 33, caput, da Lei n.º 11.343/2006 para sua tipificação” (TJPR - 3.ª C. Criminal - AC - 1349863-2 - Região Metropolitana de Maringá - Foro Central de Maringá - Rel.: Ângela Regina Ramina de Lucca - Unânime - J. 10.9.2015).
 
Do mesmo modo, o pedido de revisão da dosimetria da pena não merece acolhida.

Verifica-se que o MM. Juiz, em observância ao disposto no art. 42 da Lei n.º 11.343/06, e considerando a quantidade e nocividade da droga apreendida (202,40g de cocaína em pedra – crack), fixou a pena-base em 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de reclusão, o que se mostra benéfico aos acusados.

Isso porque a exasperação ficou abaixo da fração de 1/10 (um décimo) para cada circunstância negativa (quantidade e natureza da droga), a incidir sobre o intervalo da pena em abstrato, conforme orientação jurisprudencial do STJ e deste Tribunal:

“HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. NÃO CABIMENTO. TRÁFICO DE DROGAS E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO DO DELITO DE ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. ESTABILIDADE E PERMANÊNCIA DEMONSTRADAS. INADMISSIBILIDADE DE ALTERAÇÃO. REVISÃO FÁTICO-PROBATÓRIA. PENA-BASE FIXADA ACIMA DO MÍNIMO LEGAL EM RAZÃO DA QUANTIDADE, VARIEDADE E NATUREZA DOS ENTORPECENTES APREENDIDOS. QUANTUM PROPORCIONAL. COMPENSAÇÃO ENTRE A ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA E A AGRAVANTE DA REINCIDÊNCIA. NECESSIDADE. RESP N. 1.341.370/MT. RITO DOS RECURSOS REPETITIVOS. ART. 543-C DO CPP. SÚMULA N. 545/STJ. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO. (...) 3. O aumento da pena-base em 1/10, com base na natureza, na variedade e na quantidade dos entorpecentes apreendidos (195g de cocaína e 31,4g de cannabis sativa), mostra-se razoável. A quantidade de drogas é fundamentação idônea e está em consonância com o disposto no art. 42 da Lei n. 11.343/06, que prevê a preponderância de tais circunstâncias em relação às demais previstas no art. 59 do Código Penal - CP. 4. Uma vez reconhecida a atenuante da confissão espontânea, se faz de rigor a compensação com a agravante da reincidência. 5. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida, de ofício, para compensar a reincidência com a confissão espontânea, redimensionando a pena do paciente para 10 anos, 2 meses e 15 dias de reclusão, além do pagamento de 1510 dias-multa” (STJ/HC 352.983/RJ, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, QUINTA TURMA, julgado em 04/05/2017, DJe 16/05/2017).
 
“APELAÇÃO CRIMINAL - TRÁFICO DE DROGAS E PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO PROIBIDO - AGRAVANTE DA REINCIDÊNCIA - REDUTOR DO ART. 33, § 4º, DA LEI N. 11.343/06 – INAPLICABILIDADE - OFENSA AO PRINCÍPIO DO ‘NON BIS IN IDEM’ - INOCORRÊNCIA - PLEITO DE REDUÇÃO DA PENA BASE EM RELAÇÃO AO CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS - POSSIBILIDADE - PREPONDERÂNCIA DA NATUREZA E QUANTIDADE DA DROGA APREENDIDA (ART. 42 DA LEI N.º 11.343/06) - FRAÇÃO DE 1/10 (UM DÉCIMO) DE AUMENTO POR CADA VETOR NEGATIVADO - FRAÇÃO ADOTADA PELA NOVEL JURISPRUDÊNCIA DO COLENDO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E DESTA CORTE DE JUSTIÇA – PENA-BASE DO CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS REDUZIDA DE 08 (OITO) ANOS E 06 (SEIS) MESES DE RECLUSÃO E 800 (OITOCENTOS) DIAS-MULTA, PARA 07 (SETE) ANOS DE RECLUSÃO E 650 (SEISCENTOS E CINQUENTA) DIAS-MULTA, PENA A SER CUMPRIDA INICIALMENTE EM REGIME FECHADO EM DECORRÊNCIA DA REINCIDÊNCIA - RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO EM CONSONÂNCIA PARCIAL COM O PARECER DO MINISTÉRIO PÚBLICO GRADUADO” (TJRR, ACr 0829856- 66.2019.8.23.0010, Câmara Criminal, Rel. Des. LEONARDO CUPELLO, julgado em 03/03/2021, DJe: 03/03/2021).
 
Já com relação ao crime de associação para o tráfico, a pena-base foi fixada no mínimo legal de 3 (três) anos.

Outrossim, não prospera o pleito de reconhecimento da causa de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4.º, da Lei n.º 11.343/06 (tráfico privilegiado).

Nos termos do dispositivo citado, os condenados pelo crime de tráfico de drogas terão a pena reduzida, de um sexto a dois terços, quando forem reconhecidamente primários, possuírem bons antecedentes e não se dedicarem às atividades criminosas ou integrarem organização criminosa.

Logo, nos termos da doutrina e da jurisprudência dominantes, o fato de o agente dedicar-se ou não às atividades criminosas pode ser demonstrado por quaisquer meios de prova, não sendo nem mesmo necessário que o fato seja atestado por certidões de antecedentes ou existência de qualquer procedimento formal contra este, bastando que as circunstâncias apontem nesse sentido.

No caso dos autos, a expressiva quantidade e a natureza altamente deletéria do entorpecente apreendido, bem como as circunstâncias de sua apreensão, que contou com a confissão de ambos os réus acerca da prática ilícita, que se desenvolvia há aproximadamente três meses, constituem indicativos da habitualidade no comércio de drogas, sendo inaplicável o privilégio pleiteado.

Além disso, “mantida a condenação do acusado pelo crime de associação para o tráfico de entorpecentes, é incabível a aplicação do redutor por ausência de preenchimento dos requisitos legais, nos termos do art. 33, § 4º, da Lei de Drogas, tendo em vista a exigência de demonstração da estabilidade e permanência no narcotráfico para a configuração do referido delito. Confira-se: AgRg no HC 370.617/RJ, Sexta Turma, Rel. Min. Rogério Schietti Cruz, DJe 28/11/2017; e HC 408.878/SP, Quinta Turma, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, DJe de 27/9/2017” (STJ, AgRg no HC 615.554/RJ, Rel. Ministro Felix Fischer, Quinta Turma, julgado em 02/02/2021, DJe 08/02/2021).

Inviável, portanto, o reconhecimento do tráfico privilegiado.
 
Também não comporta provimento os pedidos de estabelecimento de regime menos gravoso que o semiaberto, bem como a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, porquanto a quantidade de pena estabelecida é incompatível com regime inicial mais brando e com a pretendida substituição, nos termos do arts. 33, § 2.º, “b”, e 44, I, ambos do CP.
 
Por fim, pleiteiam os apelantes a concessão do direito de recorrer em liberdade, tendo em vista o regime fixado na sentença (semiaberto).

Melhor sorte não lhes assiste.

A atual jurisprudência é firme no sentido de que “não há incompatibilidade na fixação do modo semiaberto de cumprimento da pena e o instituto da prisão preventiva, bastando a adequação da constrição ao modo de execução estabelecido”¹, através da expedição da guia de execução provisória (¹STJ, HC 383.739/BA, 5.ª Turma, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 16/03/2017, DJe 27/03/2017).

Extrai-se do voto do Ministro Relator:

“Esta Corte firmou orientação no sentido de que a circunstância de, na sentença condenatória, ter sido fixado o regime semiaberto para cumprimento da pena não confere ao réu, por si só, o direito de recorrer em liberdade, se subsistentes os pressupostos que justificaram a prisão preventiva, como no caso concreto. Todavia, até o trânsito em julgado da sentença condenatória, deverão ser assegurados os direitos concernentes ao regime prisional estabelecido. Na hipótese, não verifico qualquer constrangimento ilegal a ser sanado, uma vez que a prisão foi decretada em decisão fundamentada e foi recomendado pelo Tribunal que se observasse o regime imposto na sentença”.

Seguindo tal posicionamento, cito os seguintes julgados desta Câmara Criminal:

“HABEAS CORPUS – TRÁFICO PRIVILEGIADO – PRISÃO PREVENTIVA MANTIDA NA SENTENÇA CONDENATÓRIA – NEGATIVA DO DIREITO DE APELAR EM LIBERDADE – ALEGAÇÃO DE INCOMPATIBILIDADE DA PRISÃO PREVENTIVA COM O REGIME SEMIABERTO – IMPROCEDÊNCIA – ATUAL ORIENTAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA NO SENTIDO DE SER COMPATÍVEL O REGIME SEMIABERTO DE CUMPRIMENTO DA PENA COM O INSTITUTO DA PRISÃO PREVENTIVA, BASTANDO A ADEQUAÇÃO DA CONSTRIÇÃO AO MODO DE EXECUÇÃO ESTABELECIDO NA SENTENÇA, ATRAVÉS DA EXPEDIÇÃO DA GUIA DE EXECUÇÃO PROVISÓRIA – ORDEM DENEGADA” (TJRR, HC n.º 9002519- 12.2019.8.23.0000, C. Crim., Rel. Des. Ricardo Oliveira, j. 04/02/2020, publicado em 02/03/2020).
 
“HABEAS CORPUS – CONDENAÇÃO EM REGIME SEMIABERTO – MANUTENÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA – PROIBIÇÃO DE RECORRER EM LIBERDADE – DECISÃO FUNDAMENTADA – EXPEDIÇÃO DE GUIAS PROVISÓRIAS – ILEGALIDADE NÃO CONFIGURADA – HABEAS CORPUS CONHECIDO E DENEGADO.” (TJRR, HC n.º 0000.17.000819-7, C. Crim., Rel. Des. Jésus Nascimento, j. 25/04/2017, DJe 03/05/2017, p. 26).
 
Registre-se, por oportuno, já foram expedidas pelo Juízo a quo as guias de execução provisória das penas no regime semiaberto, nos termos dos arts. 8.º e 9.º da Resolução CNJ n.º 113/10, compatibilizando, assim, a manutenção da custódia cautelar com o referido modo de execução da reprimenda (EPs 118.1 e 119.1 – mov. 1.º grau).
 
Ademais, verifico que os recorrentes responderam presos a todo o processo. Assim, proferida sentença condenatória, restou demonstrado que não houve alteração dos motivos que ensejaram a prisão preventiva, devendo a ser mantida a custódia para garantia da ordem pública.
 
A propósito, conforme a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, “[...] não há lógica em deferir ao condenado o direito de recorrer solto quando permaneceu preso durante a persecução criminal, se persistem os motivos para a segregação preventiva” (STJ, RHC 98.304/MS, Rel. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 23/08/2018, DJe 29/08/2018).
 
ISTO POSTO, em consonância com o parecer ministerial, rejeito a preliminar, e, no mérito, nego provimento aos apelos.

É como voto.

Boa Vista, 13 de abril de 2021.


Des. RICARDO OLIVEIRA
Relator 




EMENTA:

APELAÇÕES CRIMINAIS – TRÁFICO DE DROGAS E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO, EM CONCURSO MATERIAL – (1) PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA POR AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA (SENTENÇA GENÉRICA) – REJEIÇÃO – SENTENÇA QUE ATENDE AOS REQUISITOS PREVISTOS NO ART. 381 DO CPP – (2) MÉRITO – (2.1) ABSOLVIÇÃO – IMPOSSIBILIDADE – MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS – CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE PARA DEMONSTRAR O TRÁFICO E A ESTABILIDADE E PERMANÊNCIA DA ASSOCIAÇÃO – (2.2) DESCLASSIFICAÇÃO PARA PORTE PARA USO PRÓPRIO – INVIABILIDADE – CIRCUNSTÂNCIAS QUE DEMONSTRAM QUE A DROGA NÃO SE DESTINAVA EXCLUSIVAMENTE AO CONSUMO PESSOAL– (3) DOSIMETRIA – (3.1) PENAS-BASES FIXADAS UM POUCO ACIMA DO MÍNIMO LEGAL – PREPONDERÂNCIA DA NATUREZA E QUANTIDADE DA DROGA SOBRE AS CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS DO ART. 59 DO CP – EXPRESSIVA QUANTIDADE DE COCAÍNA (CRACK) APREENDIDA, SUBSTÂNCIA DE ELEVADO GRAU DE NOCIVIDADE – BASILARES CORRETAMENTE FIXADAS – (3.2) RECONHECIMENTO DA MINORANTE DO § 4.º DO ART. 33 DA LEI DE DROGAS (TRÁFICOPRIVILEGIADO) – DESCABIMENTO – INCOMPATIBILIDADE COM A CONDENAÇÃO POR ASSOCIAÇÃO, TENDO EM VISTA A DEDICAÇÃO ÀS ATIVIDADES CRIMINOSAS – (4) CONCESSÃO DO DIREITO DE RECORRER EM LIBERDADE – ALEGAÇÃO DE INCOMPATIBILIDADE DA PRISÃO PREVENTIVA COM O REGIME SEMIABERTO – IMPROCEDÊNCIA – ATUAL ORIENTAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA NO SENTIDO DE SER COMPATÍVEL O REGIME SEMIABERTO DE CUMPRIMENTO DA PENA COM O INSTITUTO DA PRISÃO PREVENTIVA, BASTANDO A ADEQUAÇÃO DA CONSTRIÇÃO AO MODO DE EXECUÇÃO ESTABELECIDO NA SENTENÇA, ATRAVÉS DA EXPEDIÇÃO DA GUIA DE EXECUÇÃO PROVISÓRIA – GUIA JÁ EXPEDIDA, NOS TERMOS DOS ARTS. 8.º E 9.º DA RESOLUÇÃO CNJ N.º 113/10 – (5) RECURSOS DESPROVIDOS.



ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os membros da Câmara Criminal do egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, por unanimidade, em consonância com o parecer ministerial, em rejeitar a preliminar e, no mérito, em negar provimento aos apelos, nos termos do voto do Relator.

Presenças: Des. Ricardo Oliveira (Presidente e Relator), Des. Leonardo Cupello (Revisor), Des. Almiro Padilha (Julgador) e o representante da douta Procuradoria de Justiça.

Sala das Sessões, em Boa Vista, 13 de abril de 2021.
 

Des. RICARDO OLIVEIRA
Relator 



RESUMO ESTRUTURADO
APELAÇÕES CRIMINAIS – TRÁFICO DE DROGAS E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO, EM CONCURSO MATERIAL – (1) PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA POR AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA (SENTENÇA GENÉRICA) – REJEIÇÃO – SENTENÇA QUE ATENDE AOS REQUISITOS PREVISTOS NO ART. 381 DO CPP – (2) MÉRITO – (2.1) ABSOLVIÇÃO – IMPOSSIBILIDADE – MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS – CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE PARA DEMONSTRAR O TRÁFICO E A ESTABILIDADE E PERMANÊNCIA DA ASSOCIAÇÃO – (2.2) DESCLASSIFICAÇÃO PARA PORTE PARA USO PRÓPRIO – INVIABILIDADE – CIRCUNSTÂNCIAS QUE DEMONSTRAM QUE A DROGA NÃO SE DESTINAVA EXCLUSIVAMENTE AO CONSUMO PESSOAL– (3) DOSIMETRIA – (3.1) PENAS-BASES FIXADAS UM POUCO ACIMA DO MÍNIMO LEGAL – PREPONDERÂNCIA DA NATUREZA E QUANTIDADE DA DROGA SOBRE AS CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS DO ART. 59 DO CP – EXPRESSIVA QUANTIDADE DE COCAÍNA (CRACK) APREENDIDA, SUBSTÂNCIA DE ELEVADO GRAU DE NOCIVIDADE – BASILARES CORRETAMENTE FIXADAS – (3.2) RECONHECIMENTO DA MINORANTE DO § 4.º DO ART. 33 DA LEI DE DROGAS (TRÁFICOPRIVILEGIADO) – DESCABIMENTO – INCOMPATIBILIDADE COM A CONDENAÇÃO POR ASSOCIAÇÃO, TENDO EM VISTA A DEDICAÇÃO ÀS ATIVIDADES CRIMINOSAS – (4) CONCESSÃO DO DIREITO DE RECORRER EM LIBERDADE – ALEGAÇÃO DE INCOMPATIBILIDADE DA PRISÃO PREVENTIVA COM O REGIME SEMIABERTO – IMPROCEDÊNCIA – ATUAL ORIENTAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA NO SENTIDO DE SER COMPATÍVEL O REGIME SEMIABERTO DE CUMPRIMENTO DA PENA COM O INSTITUTO DA PRISÃO PREVENTIVA, BASTANDO A ADEQUAÇÃO DA CONSTRIÇÃO AO MODO DE EXECUÇÃO ESTABELECIDO NA SENTENÇA, ATRAVÉS DA EXPEDIÇÃO DA GUIA DE EXECUÇÃO PROVISÓRIA – GUIA JÁ EXPEDIDA, NOS TERMOS DOS ARTS. 8.º E 9.º DA RESOLUÇÃO CNJ N.º 113/10 – (5) RECURSOS DESPROVIDOS.

TJRR (ACr 0823509-17.2019.8.23.0010, Câmara Criminal, Rel. Des. RICARDO OLIVEIRA, julgado em 13/04/2021, DJe: 29/09/2021)