Processo número: 0803863-50.2021.8.23.0010


CÂMARA CRIMINAL

Apelação Criminal n. 0803863-50.2021.8.23.0010
Apelante: D. O. F.
Defesa: Defensoria Pública do Estado de Roraima
Apelada: J. de F. R. S.
Defesa: Defensoria Pública do Estado de Roraima
Relatora: Juíza Convocada Graciete Sotto Mayor



RELATÓRIO

Cuida-se de recurso de apelação interposto por D. O. F. (EP 46.1, 1.º grau) contra sentença (EP 31.1, 1.º grau) proferida pelo MM. Juiz de Direito do 2.º Juizado de Violência Doméstica da Comarca de Boa Vista/RR, que confirmou as medidas protetivas de urgência concedidas liminarmente em favor da vítima J. de F. R. S. .

Nas suas razões recursais, a defesa requer: 1) a revogação das medidas protetivas de urgência, alegando que elas foram fixadas mediante análise unilateral dos fatos relatados pela vítima e que também não houve a ameaça descrita por ela (EP 46.1, 1.º grau).

Em contrarrazões, a apelada Jamile de Freitas Roque Sales requereu o conhecimento do recurso e, no mérito, seu desprovimento, mantendo-se as medidas protetivas de urgência (EP 57.1, 1.º grau).

A Procuradoria de Justiça apresentou parecer opinando pelo conhecimento e, no mérito, pelo desprovimento do apelo (EP 8.1).

É o relatório.

Feito que independe de revisão regimental. Inclua-se em pauta para julgamento.

Boa Vista/RR, data inclusa pelo sistema.


Graciete Sotto Mayor
Juíza Convocada



VOTO

Presentes os pressupostos de admissibilidade, razão pela qual conheço do recurso.

Como exposto no relatório, a defesa constituída de C. d. O. M. interpôs recurso contra sentença que confirmou as medidas protetivas de urgência – MPU concedidas liminarmente em favor da vítima J. de F. R. S., ex-companheira do apelante.

O apelante alega que inexiste qualquer prova de ameaça que tenha feito à vítima e que ele estaria sendo ameaçado por ela de “tornar sua vida um inferno”, quando decidiu encerrar qualquer tipo de relação com a ofendida, após flagrá-la em um novo relacionamento com terceira pessoa.

Aduz que não há como manter as medidas protetivas, pois não houve cometimento de qualquer crime, bem como pela ausência de demonstração de ocorrência de ameaça.

Apesar de todas as argumentações expostas, o pleito requerido não encontra amparo.

Relevante destacar que a Lei Maria da Penha tem como propósito criar mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, sendo ela qualquer ação ou omissão baseada no gênero e que venha a prejudicar física ou psicologicamente a vítima.

Em análise aos autos em que foi concedida a MPU, observo que, ao registrar o boletim de ocorrência n. 154/2021, a vítima relatou que duas pessoas em uma motocicleta foram até sua residência e que não seria a primeira vez que isso acontecia, pois aproximadamente um mês antes ele pulou o muro de sua casa e ficou batendo na janela, querendo entrar. Disse que ele vem lhe perseguindo na rua, vigiando e querendo saber com quem anda e que certo dia ele a viu com seu atual namorado e ameaçou-lhe com as seguintes palavras “vou me vingar, isso não vai ficar assim, você fica esperta”.

O que se extrai do relato acima é que a vítima estava sofrendo ameaças, violência psicológica, sendo também privada de paz e sossego pelo apelante que não gostou de vê-la com outra pessoa.

Como bem observado pelo parquet graduado, a restrição de liberdade imposta ao apelante apenas na medida necessária para assegurar a incolumidade psíquica da suposta vítima evita contatos desnecessários que poderiam estimular o acirramento de ânimos e escalada de violência.

Registre-se que os ciclos de violência doméstica são complexos e por muitas vezes envolvem momentos de convivência amigável, com casos de agressão psicológica, física, moral ou econômica, perpetuando-se por muitos anos até que a vítima tenha coragem de pôr fim aos relacionamentos abusivos.

Assim, resta-me claro que o apelante praticou violência doméstica e familiar contra a vítima, devendo assim ser denegado o pleito de revogação da MPU e mantida a sentença in totum, ainda que apenas fundamentada na palavra da ofendida e sem a comprovação da ameaça, como requerido pela defesa do apelante.

Ademais, como se sabe, os crimes de violência doméstica, geralmente são praticados na esfera da convivência íntima e em situação de vulnerabilidade, sem a presença de testemunhas, por isso à palavra da vítima é agregada relevo especial quando em consonância com os demais elementos de convicção constantes nos autos.

Por todo o exposto, voto pelo conhecimento e desprovimento do recurso interposto, em consonância com o parquet graduado nos termos das fundamentações acima.

É como voto.



EMENTA

APELAÇÃO CRIMINAL – LEI MARIA DA PENHA – DECISÃO QUE CONFIRMA MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA CONCEDIDAS LIMINARMENTE. 1) PLEITO DE REVOGAÇÃO DA MPU, SOB A ALEGAÇÃO DE ANÁLISE UNILATERAL DOS FATOS – IMPOSSIBILIDADE – PREVALÊNCIA DA PALAVRA DA VÍTIMA PRESTADA NA FASE POLICIAL E CORROBORADA EM JUÍZO – MEDIDA JUDICIAL QUE VISA A GARANTIA DA INTEGRIDADE FÍSICA E PSÍQUICA DA VÍTIMA – MPUS QUE DEVEM PERMANECER, POIS NÃO HOUVE ALTERAÇÃO FÁTICA – MANUTENÇÃO DA SENTENÇA – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO EM CONSONÂNCIA COM O MP GRADUADO.



ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de Apelação Criminal, acordam os Excelentíssimos Senhores Desembargadores integrantes da Colenda Câmara Criminal do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, à unanimidade e em consonância com o parquet graduado, em conhecer do recurso e desprovê-lo, nos termos do voto da Relatora, que fica fazendo parte deste Julgado.

Participaram do julgamento os Desembargadores Ricardo Oliveira (Presidente/Julgador) e Leonardo Cupello (Julgador), a Juíza Convocada Graciete Sotto Mayor Ribeiro (Relatora) e o (a) representante da Procuradoria de Justiça.

Sala das Sessões do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, aos catorze dias do mês de dezembro do ano de dois mil e vinte um.


Graciete Sotto Mayor Ribeiro
Juíza Convocada



RESUMO ESTRUTURADO
APELAÇÃO CRIMINAL – LEI MARIA DA PENHA – DECISÃO QUE CONFIRMA MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA CONCEDIDAS LIMINARMENTE. 1) PLEITO DE REVOGAÇÃO DA MPU, SOB A ALEGAÇÃO DE ANÁLISE UNILATERAL DOS FATOS – IMPOSSIBILIDADE – PREVALÊNCIA DA PALAVRA DA VÍTIMA PRESTADA NA FASE POLICIAL E CORROBORADA EM JUÍZO – MEDIDA JUDICIAL QUE VISA A GARANTIA DA INTEGRIDADE FÍSICA E PSÍQUICA DA VÍTIMA – MPUS QUE DEVEM PERMANECER, POIS NÃO HOUVE ALTERAÇÃO FÁTICA – MANUTENÇÃO DA SENTENÇA – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO EM CONSONÂNCIA COM O MP GRADUADO.

TJRR (ACr 0803863-50.2021.8.23.0010, Câmara Criminal, Rel. Juíza Conv. GRACIETE SOTTO MAYOR RIBEIRO, julgado em 15/12/2021, DJe: 23/12/2021)